Por Bruno Rosa
Vivemos sob a ilusão de que somos seres racionais, capazes de avaliar o valor intrínseco das coisas. Acreditamos que um preço é "justo", que um problema é "grave" ou que uma oportunidade é "imperdível" por méritos próprios do objeto em questão. No entanto, a ciência da persuasão e a neurociência nos mostram uma realidade diferente: o cérebro humano não foi projetado para a percepção absoluta. Nós somos, por natureza, máquinas de comparação.
O breve, mas profundo, texto sobre a arte da persuasão através do contraste nos oferece uma lente de aumento para a maneira como processamos informações e, crucialmente, como somos levados à ação. A história do cego e do especialista em propaganda não é apenas uma abordagem inteligente; é uma aula específica sobre a relatividade da percepção humana e sua aplicação prática no mundo da comunicação e da influência.
A premissa central de que "o cérebro não possui percepção absoluta, mas relativa" é o cerne da questão. Não avaliamos o mundo em valores absolutos – bom ou ruim, caro ou barato, triste ou feliz – mas sempre em relação a um ponto de referência. O especialista em propaganda soube disso instintivamente. A mensagem original, "EU SOU CEGO", apela à pena, mas a pena em si é uma emoção passiva. A adição das palavras "É PRIMAVERA E..." transforma a simples informação em uma experiência comparativa.
Ao ler a placa alterada, o passante é forçado a um contraste visceral: sua própria alegria e capacidade de desfrutar da beleza da primavera contra a escuridão perpétua do cego. A ausência de visão é justaposta à sua própria posse da visão, e é esse contraste ativo que move o ponteiro da compaixão para a ação, no caso a doação.
É preciso entender que o cérebro não possui percepção absoluta, mas relativa. Isto significa que não temos clareza sobre as coisas, até estabelecermos alguma referência de comparação. Por exemplo, um relógio custando mil reais é caro, mas esse exemplo só reforça a natureza fluida do valor. Comparado a que? Sem dúvida, este relógio na vendinha do Zezinho onde os itens custam em média vinte reais, seria um item caro. Mas na loja da Swarovski em Mônaco onde a média de preço dos produtos é equivalente a trinta mil reais, o relógio seria bem barato. Portanto, se queremos influenciar com propriedade, é preciso criar contraste entre a proposta apresentada e outra referência. Sua opção pura e simplesmente não trará a conotação desejada, porque o preço que só adquire significado quando comparado ao seu entorno. O valor não está no item, mas no contexto criado para ele.
Esse desdobramento tem implicações profundas em diversas áreas, como marketing e vendas, onde a precificação por contraste é uma tática fundamental. Ao apresentar uma "Opção Premium" deliberadamente cara, o vendedor não necessariamente espera que ela seja comprada. O verdadeiro objetivo é fazer com que a "Opção Intermediária" pareça razoável, uma "pechincha" em comparação, influenciando o cliente a escolhê-la com satisfação.
Pensando em comunicação Política e Persuasão, os políticos não destacam suas propostas em um vácuo; eles as contrastam vigorosamente com as falhas ou ameaças do adversário. A criação de um "cenário catastrófico" (a referência) é frequentemente mais poderosa do que a descrição detalhada do próprio plano. É preciso que o eleitor sinta a diferença entre as opções.
Agora no que se refere a gestão e liderança, podemos considerar que um líder que deseja inspirar uma mudança cultural não deve apenas descrever a visão futura, mas criar um contraste nítido com o estado atual. A dor ou a ineficiência do status quo precisa ser sentida para que a proposta de mudança (o novo referencial) seja percebida como uma melhoria urgente e significativa.
Mas considerando-se o Imperativo de Criar a Referência, temos que pensar que se alguém quer influenciar com propriedade, é preciso criar contraste entre a sua proposta e outra referência.
Essa é a mensagem mais importante. A eficácia da comunicação reside na nossa capacidade de não apenas apresentar o nosso ponto de vista, mas de estruturar a realidade perceptiva do nosso público. Sua ideia de sustentabilidade é poderosa, mas se não for contrastada com a ameaça real e visível da crise climática, ela será apenas uma ideia agradável.
Seu currículo é impressionante, mas se não for contrastado com a falta de experiência dos outros candidatos (referência implícita) ou com o nível de entrega esperado pela empresa, ele será apenas um documento. Em última análise, o contraste é a ferramenta mestra que transforma a percepção passiva em engajamento ativo. Não se trata de manipulação no sentido pejorativo, mas sim de engenharia cognitiva: guiar a mente humana para o referencial que torna a nossa proposta não apenas visível, mas irresistível. Quem domina a arte de criar a referência domina a arte da influência. A primavera só é sentida em sua plenitude por quem entende o que é o inverno ou, no caso do cego, o que é a escuridão.
*Bruno Rosa é engenheiro eletricista e managing director da Domperf High Performance, empresa de treinamento de alto desempenho profissional e consultoria empresarial. Há mais de uma década tem se dedicado ao estudo da neurociência e comportamento, estabelecendo padrões práticos baseados em conceitos dos maiores especialistas do mercado. A partir dessa experiência e vivências internacionais criou e aperfeiçoou uma metodologia inovadora baseada em situações de dentro e fora de empresas.

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