Lesão por pressão: não é destino, é prevenção


Por Drª. Renata Pietro, intensivista e Presidente do Departamento de Enfermagem da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB).

 


 

As lesões por pressão (LPP) são um problema de saúde pública significativo que estão entre as complicações mais prevalentes e evitáveis no cuidado em saúde, sendo que aproximadamente 1 em cada 10 pacientes hospitalizados podem desenvolvê-las ao longo da internação. Por trás desse número estão dores intensas, risco de infecção, piora clínica e aumento do tempo de internação. Como profissional da terapia intensiva, vejo diariamente algo que ainda pouco se reconhece: a LPP não é consequência natural do adoecimento, ela é, na maior parte das vezes, um indicador da qualidade do cuidado prestado. 1 
 

Apesar de muitas vezes associadas apenas ao tempo em que o paciente permanece na mesma posição, as LPPs são o resultado de um conjunto de fatores que envolvem desde o estado clínico do indivíduo até a organização dos processos assistenciais. Idosos, pacientes acamados, indivíduos com mobilidade reduzida, pessoas com comorbidades ou sob uso de medicamentos específicos têm a pele mais suscetível a danos. Fragilidade da pele, doenças pré-existentes, nutrição inadequada, uso de determinados medicamentos, pouca mobilidade e até o microclima do leito influenciam diretamente o risco de desenvolvimento das lesões; o que torna a prevenção um esforço conjunto entre diferentes profissionais e áreas.2 
 

A avaliação de risco não pode ser pontual ou burocrática. Escalas preditivas devem ser usadas diariamente e associadas à observação clínica individual: sedação, nutrição, estabilidade hemodinâmica, edema, exposição à umidade, histórico de lesões prévias. A pele precisa ser vista como um órgão em risco, assim como coração e pulmões, e monitorada com o mesmo rigor.
 

O risco é ainda maior em pacientes críticos, que muitas vezes dependem de sedação, têm mobilidade reduzida ou passam por instabilidade hemodinâmica. Nesses casos, práticas como a mobilização precoce, o ajuste correto do leito, o posicionamento do paciente e a revisão frequente da pele são estratégias essenciais para proteger áreas mais afetadas como as proeminências ósseas, incluindo região sacral, calcanhares, tornozelos, cotovelos, ombros e região trocantérica.
 

A tecnologia é uma aliada essencial. Camas com redistribuição de pressão, sensores e sistemas de monitoramento permitem que protocolos de prevenção sejam aplicados com consistência. Não substituem a prática clínica, mas ampliam a capacidade da equipe hospitalar: distribuem melhor a pressão, controlam o microclima, favorecem a mobilização e o reposicionamento e oferecem dados objetivos que ajudam equipes a agir antes que a lesão se instale.
 

A prevenção, no entanto, não se limita aos hospitais. Com o aumento do cuidado domiciliar, cresce também o número de pacientes expostos ao risco. Idosos, pessoas acamadas e indivíduos com dependência funcional precisam de atenção especial. Orientações simples sobre reposicionamento, hidratação, higiene, nutrição e uso de superfícies adequadas podem evitar complicações e garantir mais conforto e segurança para o paciente e seus cuidadores.
 

Programas bem-sucedidos de prevenção passam pela avaliação precoce do risco, adoção de rotinas estruturadas e educação contínua das equipes e cuidadores. Recursos modernos também complementam esse cuidado, facilitando a execução dos protocolos e contribuindo para melhores resultados clínicos.

No mês em que se chama a atenção para a prevenção da lesão por pressão, a mensagem central é clara: a maior parte das lesões pode ser evitada quando o cuidado é organizado, atento e baseado em boas práticas, tanto no hospital quanto no ambiente domiciliar.


¹ Tervo-Heikkinen T, Heikkilä A, Koivunen M, Kortteisto T-R, Peltokoski J, Salmela S, Sankelo M, Ylitörmänen T-S, Junttila K. Pressure injury prevalence and incidence in acute inpatient care and related risk factors: A cross-sectional national study. Int Wound J. 2021 Oct;19(4):919–931. doi: 10.1111/iwj.13692.
2 Trebbi A, Mukhina E, Rohan P-Y, Connesson N, Bailet M, Perrier A, Payan Y. MR-based quantitative measurement of human soft tissue internal strains for pressure ulcer prevention. Medical Engineering & Physics. 2022; 108:103888. doi: 10.1016/j.medengphy.2022.103888.

Comentários