Endividamento rural cresce e inadimplência atinge maior nível da série histórica; crise de crédito expõe fragilidade do setor, alerta especialista
Retração das linhas oficiais, migração forçada para “juros livres” e alta dos custos de produção pressionam especialmente grandes produtores, aponta Leandro Marmo, advogado do agronegócio
A inadimplência no crédito rural atingiu um dos patamares mais altos já registrados pelo Banco Central, refletindo um ambiente de forte pressão financeira no campo. Segundo dados oficiais, a taxa de inadimplência entre produtores pessoa física chegou a 7,9%, enquanto entre grandes produtores o índice superou 10,7%, o maior nível desde o início da série histórica.
Para o advogado Leandro Marmo, especialista em direito do agronegócio e CEO do escritório João Domingos Advogados, o relatório do Banco Central confirma uma realidade há meses percebida no dia a dia do produtor rural: custos em disparada, crédito restrito e operações com taxas cada vez mais elevadas.
“Com a disparada dos custos de produção e a retração do crédito rural via linhas oficiais, muitos produtores não conseguem mais acessar financiamento com taxas subsidiadas e acabam sendo obrigados a recorrer aos chamados juros livres, cujo custo é muito superior”, explica Marmo.
O advogado afirma que a diferença entre o crédito rural tradicional, amparado por subsídios e regras específicas, e o crédito de mercado está criando um abismo financeiro. “Essa escalada de encargos, somada às práticas abusivas de vendas casadas impostas por algumas instituições financeiras, cria um verdadeiro sufoco para quem vive do campo”, critica.
Alta dos insumos e queda da rentabilidade criam “efeito tesoura”
O movimento de inadimplência não ocorre isoladamente. A elevação expressiva dos preços de insumos, fertilizantes, combustíveis e defensivos, somada à queda ou instabilidade dos preços de commodities como soja e milho, formou o que especialistas chamam de “efeito tesoura”: os custos crescem mais rápido do que a receita do produtor. De acordo com Marmo, esse cenário corrói margens e impede que produtores consigam honrar dívidas contraídas em ciclos de custos mais baixos.
“O produtor já entra pressionado pelo preço dos insumos e pela insatisfação do mercado comprador. Quando se vê obrigado a financiar a safra a juros altos, o resultado é o estrangulamento financeiro: as dívidas se acumulam e a margem desaparece”, afirma.
Queda no crédito subsidiado e aumento do risco bancário
Relatórios recentes do sistema financeiro mostram que o volume de crédito rural com taxas controladas não acompanhou a demanda. A redução das linhas do Plano Safra e a maior exigência de garantias levaram muitos produtores a migrarem para operações de mercado, mais caras e mais arriscadas.
Instituições financeiras têm elevado provisões e adotado critérios mais rígidos de concessão, o que dificulta ainda mais o acesso ao financiamento rural. Esse encarecimento do crédito, segundo Marmo, produz um ciclo de retroalimentação da inadimplência.
Diante do cenário de risco crescente, Marmo recomenda atenção redobrada às condições de crédito, às renegociações e aos contratos firmados com agentes financeiros.
“Este é um momento que exige cautela. A renegociação precisa ser feita antes da inadimplência, com análise jurídica e financeira cuidadosa. Muitos produtores não sabem que podem contestar cláusulas abusivas e rever contratos que comprometem a continuidade da atividade”, orienta.
Perspectiva para 2025–2026: o risco é sistêmico
Para o advogado, a persistência desse ambiente pode gerar impacto estrutural no agronegócio. Grandes produtores, geralmente considerados mais resilientes, já lideram os índices de endividamento, e isso liga um sinal de alerta no setor financeiro. “Não estamos diante de um problema isolado ou circunstancial. É um risco sistêmico para o campo. Sem crédito acessível, o produtor reduz investimento, planta menos, produz menos, e toda a cadeia sente”, conclui Leandro Marmo.
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