Por Sthefano Scalon Cruvinel, Doutrinador do Direito, Auditor Judicial com atuação no STJ, Coord. CEO da EvidJuri e especialista em Direito e Tecnologia
Durante o julgamento dos acusados pela tentativa de golpe de Estado, o ministro Cristiano Zanin apontou que os advogados de defesa não buscaram auxílio técnico para examinar as provas apresentadas nos autos. A fala, feita no início de seu voto sobre a preliminar de cerceamento de defesa, precisa ser recebida como mais do que uma observação pontual: trata-se de um chamado à realidade.
O sistema de Justiça brasileiro ainda insiste em tratar processos complexos como se estivéssemos na era do papel e da máquina de escrever. Hoje, provas digitais, registros de mensagens, metadados, rastros em nuvem, entre outros, são o centro de disputas que podem definir o futuro de uma democracia. Exigir que advogados, por conta própria, tenham condições de auditar evidências dessa natureza é não apenas irreal, mas perigoso.
Zanin está certo ao expor essa deficiência. Não basta levantar a bandeira do contraditório e da ampla defesa se, na prática, o país não oferece meios técnicos para que a defesa possa questionar as provas de forma qualificada. Esse abismo entre a complexidade das acusações e a fragilidade das ferramentas de contestação coloca em xeque a paridade de armas, um dos princípios fundamentais da justiça.
O caminho não é relativizar a importância das provas, mas institucionalizar a presença de especialistas e peritos independentes no processo. Assim como o Estado conta com estruturas robustas para investigar, é urgente que os tribunais garantam às defesas acesso a auditorias técnicas imparciais, certificadas e com prazo razoável de análise.
Não se trata de beneficiar acusados, mas de fortalecer o sistema jurídico. Uma justiça que ignora a necessidade de modernização se fragiliza, porque dá espaço para que condenações sejam vistas como produto de um desequilíbrio estrutural, e não da verdade processual.
O STF deu o alerta. Cabe agora à advocacia, ao legislativo e às instituições reconhecerem que o tempo das teses sem base técnica acabou. A democracia exige transparência e rigor, e isso só será alcançado quando especialistas e auditorias independentes fizerem parte do processo judicial brasileiro de forma sistemática.
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