*José Renato Nalini
Pessoas há que acumulam bens durante
toda a vida e, quando morrem, deixam problemas para os descendentes. As
famílias nem sempre são aquele ninho de amor e de harmonia com que o conceito é
dulcificado em teoria e delineado na poesia. Elas vão se transformando com a
chegada de elementos provindos de outras culturas e histórias. O direito
sucessório tem milhões de casos emblemáticos em que herdeiros se digladiam,
perdem amizade, compostura e até a própria saúde e aquela fortuna vai ser
dilapidada. Quem mais leva proveito com a encrenca é o advogado...
Por isso, a melhor coisa que alguém
pode fazer em vida é contribuir para que a vida possa prosseguir neste planeta
que é o único disponível, o único a aceitar como inquilino esta racinha irracional
e egoísta que é a humana.
Veja-se a beleza da vida de
Sebastião Salgado, recentemente falecido. Ele restaurou uma região completamente
estéril, que fora alvo de extermínio de parte dos seres egoístas que se
especializaram em fabricar desertos. Em São Paulo, a “selva de pedra”, cidade
que se impermeabilizou e que serve mais ao automóvel do que às pessoas, o
advogado Jayme Vita Roso formou uma beleza de área florestal no extremo sul da
pauliceia, exatamente a região que hoje é alvo da devastação orquestrada e que
põe em risco o abastecimento de água para os quase treze milhões de paulistanos.
Outro exemplo edificante,
recentemente noticiado, é o de Maria Cristina Garcez, que depois de elaborar
projetos sustentáveis na França e na China, quis fazer algo benéfico para a sua
pátria, o Brasil. Descobriu uma área degradada em Bananal e resolveu
reflorestá-la com espécies nativas da Mata Atlântica. Seu objetivo é atrair o
lobo-guará, o único lobo brasileiro ameaçado de extinção. Embora seja lobo e a
nossa consciência está repleta das estórias de “lobo mau”, esse exemplar da
fauna tupiniquim só se alimenta de uma fruta, produzida pela lobeira (Solanum
lycocarpum é o nome científico).
Nos tempos em que o Brasil era a
promissora potência verde, a esperança de preservação do maior patrimônio
pátrio, a exuberante biodiversidade aqui generosamente ofertada pela
Providência, a ciência jurídica ofertou inúmeros instrumentos de preservação.
Um deles é a RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural, unidade de
conservação de domínio privado, iniciativa do proprietário interessado em
preservar o ambiente, a biodiversidade que tem flora e fauna incríveis.
É importante que os proprietários de
imóveis tenham em vista a verdade inafastável: ninguém leva consigo, quando
deixar esta peregrinação, aquilo que amealhou. O solo pátrio está sendo a cada
dia mais degradado. Para o Brasil, a principal causa do aquecimento global é,
exatamente, o desmatamento. A voracidade do ogronegócio, aquele que se
distingue do agronegócio, faz derrubar sem piedade florestas que a natureza
levou milhares de anos para formar. Faz ali um plantio e exaure a terra, depois
destinada a ser pasto. E o próximo passo é o deserto.
Quem tiver juízo ainda pode fazer
com que, em vez de deixar herança para acabar com a família, deixe um legado.
Sob a forma de uma floresta, que vai garantir redução da temperatura – temos
tido os anos mais quentes da História e tudo indica que 2025 não será diferente
– abrigo para a fauna, garantia da biodiversidade e de chuva. A escassez
hídrica está no horizonte próximo de toda a humanidade.
Jundiaí possui a Serra do Japi, que
está sendo continuamente ameaçada pela especulação imobiliária. Seja um herói e
ajude a reflorestar o último remanescente de mata nativa nas proximidades da
maior cidade da América Latina. Deixe um bosque de legado, não encrenca para os
filhos.
*José Renato Nalini é
Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e
Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo.
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