Fé e Movimento: A influência da religiosidade, espiritualidade e do exercício físico na prevenção do suicídio
Por Renato da Silva Fernandez (Padre e escritor); Ednei Fernando dos Santos (Sargento do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo) e Marcelo Donizeti Silva (Cabo do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo)
Religiosidade, espiritualidade e exercício físico: o tripé que pode salvar vidas
Vivemos tempos em que a dor da alma tem se tornado uma epidemia silenciosa. O suicídio, essa tragédia evitável, ceifa mais de 700 mil vidas todos os anos no mundo. No Brasil, infelizmente, os números não param de crescer. Sentimos, como estudiosos, como cristãos e como cidadãos, o chamado para olhar essa realidade com compaixão, fé e coragem. É por isso que escrevemos este artigo, não apenas como pesquisadores, mas como irmãos de caminhada, para apresentar caminhos que unem ciência, espiritualidade e movimento.
Mais do que uma simples revisão teórica, este trabalho nasceu da convicção de que a fé não é passiva, e que o corpo é templo do Espírito Santo (1Cor 6,19). Por isso, exploramos de forma integrada como a religiosidade, a espiritualidade e a prática regular de exercício físico atuam como potentes aliados na prevenção do suicídio. A ciência tem confirmado aquilo que o coração já pressentia: quando o ser humano se sente parte de algo maior e cuida de si com amor e propósito, o risco de desistir da própria vida diminui.
Nos estudos que revisamos entre 2012 e 2024, encontramos evidências tocantes. A oração, a meditação, a participação em comunidades de fé, o louvor e o contato com o sagrado proporcionam suporte emocional, pertencimento e sentido existencial. Como escreveu Koenig (2012), "a religiosidade oferece um recurso vital em momentos de crise". Já a espiritualidade, essa busca íntima de conexão com o divino, ainda que fora de ritos formais, alimenta a esperança e fortalece a alma cansada.
Do ponto de vista científico, essas práticas espirituais não apenas confortam o coração, mas transformam o cérebro: estimulam a liberação de serotonina, reduzem a atividade da amígdala (centro do medo) e aumentam a capacidade de controle emocional. Ou seja, orar e se abrir à fé traz benefícios reais, mensuráveis, profundos.
Mas não para por aí. O corpo também precisa de cuidado. O exercício físico regular, seja uma caminhada, uma dança, um esporte ou até um momento de alongamento, é um remédio poderoso contra a depressão e a ansiedade. Estudos mostram que o exercício libera endorfina, dopamina e serotonina, substâncias que nos fazem sentir bem, vivos, capazes. Além disso, melhora a qualidade do sono, combate o estresse e estimula a neuroplasticidade, ou seja, ajuda o cérebro a se renovar.
Nos tocou profundamente descobrir que mesmo pequenos gestos de movimento podem salvar uma vida. Um jovem que dança e canta no grupo de jovens, uma senhora que dança na pastoral do idoso, um grupo que caminha e reza o terço pelas ruas, são práticas simples, mas com enorme poder transformador.
E quando unimos fé e movimento? O impacto é ainda maior. A integração entre religiosidade, espiritualidade e exercício físico oferece um escudo contra o desespero. Como destacamos no artigo: “a combinação desses fatores pode oferecer uma proteção adicional contra comportamentos suicidas, funcionando como uma intervenção complementar às estratégias convencionais de saúde mental”.
Cremos que a Igreja tem um papel fundamental nesse processo. Não apenas como espaço de acolhimento e evangelização, mas também como promotora de saúde integral. Que nossas comunidades se tornem centros de vida: que acolham com empatia, orientem com sabedoria e incentivem hábitos saudáveis. Que o catequista não tema falar sobre sofrimento psíquico. Que o padre, o ministro, o agente de pastoral saibam que fé também se demonstra cuidando do corpo e da mente.
A espiritualidade cristã, como ensinava Gregório de Nissa, nos lembra que somos corpo, alma e espírito, uma unidade sagrada. Ignorar qualquer uma dessas dimensões é ferir nossa própria essência. Viktor Frankl, sobrevivente de campos de concentração, dizia que a vida só se sustenta quando encontramos um sentido. E a fé, quando vivida de forma autêntica, é capaz de oferecer esse sentido mesmo nas noites mais escuras da alma.
Portanto, nossa mensagem é clara: cuidar da saúde mental não é sinal de fraqueza, mas de fé madura. Exercitar-se é um ato de louvor. Pedir ajuda é um grito de coragem. E viver, mesmo em meio às lutas, é uma oração silenciosa que ecoa até os céus.
Convidamos você, leitor, a abraçar esse caminho de fé e movimento. Que nossas igrejas sejam também lugares de promoção da vida em sua plenitude. Que o testemunho de esperança substitua o silêncio. Que, juntos, como irmãos, possamos dizer a quem sofre: você não está só.
ESTUDO DE REVISÃO
Revista QUALYACADEMICS.
Editora UNISV; v.3, n.1, 2025; p. 134-159.
SOBRE OS AUTORES
Padre Renato Ferreira
Padre graduado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), com licenciatura em Filosofia. Iniciou sua trajetória paroquial em 2013, dedicando-se com zelo à vida pastoral e à formação espiritual de suas comunidades. Atualmente, exerce o ministério como pároco na Paróquia Santa Joana d’Arc, na Diocese de Santo André (SP). Além de seu trabalho sacerdotal, também é autor do livro Dons Carismáticos – A alma em êxtase.
Prof. Dr. Ednei Fernando dos Santos
Professor graduado em Educação Física e Enfermagem, com formação acadêmica e atuação interdisciplinar na área da saúde. Especialista em Neuroanatomia e Neurofisiologia, é mestre em Ciências da Reabilitação e doutor em Ciências da Saúde – Medicina I, reunindo conhecimento sobre o funcionamento do corpo humano e os processos de recuperação funcional. Atua como 1º Sargento do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Prof. Dr. Marcelo Donizeti Silva
Professor graduado em Educação Física, com especialização em Nutrição Esportiva e Funcional. Doutor em Ciências da Saúde e atualmente pós-doutorando na mesma área, possui formação acadêmica à prática esportiva, sendo também triatleta. Além de sua atuação no ensino e na pesquisa, integra o Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo como cabo.
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