Tentando ver além das nuvens

Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor
político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato

 
Nuvens pesadas, impedem que se descubra se haverá algum raio de sol nos horizontes do amanhã. Quando este amanhã está muito distante, lá pela primavera de 2018, querer enxergar o ambiente será um exercício de adivinhação.

Há muita fumaça a cobrir os céus nos próximos meses, resultantes de fogueiras acesas no terreno da política, algumas com capacidade de queimar perfis, deixando-os fora do pleito, como é possível inferir nos casos de Luiz Inácio Lula da Silva e Aécio Neves. Como o Brasil é o país do imponderável, é possível que Lula drible as condenações e volte ao ringue.

Comecemos pela tradicional repartição do eleitorado brasileiro entre três terços, dos quais teríamos um alinhado à direita do arco ideológico, outro fixado no centro e o terceiro sediado na banda esquerda. Os restantes 10% se diluiriam para um lado ou para outro, com possibilidade de se inclinar mais para o centro, a depender do clima de 2018, significando competição ferrenha ou, ainda, absoluta indiferença ao processo eleitoral em curso.

Quem vai acusar a quentura ou a frieza do meio ambiente é o termômetro da economia, sob a hipótese de que uma boa situação econômica jogaria um dinheirinho a mais no bolso do consumidor. O coração agradecido acabaria o eleitor votando em candidatos identificados com o bem-estar. (Esta é a equação que este consultor designa de BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça).

Já um ambiente muito quente, capaz de gerar certa ebulição social, tenderia a favorecer protagonistas afastados do status quo, explicitamente localizados nas margens do arco ideológico – esquerda ou direita – e capazes de ganhar a sociedade indignada. Na ponta direita, Jair Bolsonaro, com uma visão ultra conservadora, e na margem esquerda, um perfil de oposição, saído das fileiras do PT- Fernando Haddad ou outro apoiado por aquele partido. Se Luiz Inácio salvar-se da fogueira, poderia se transformar em eixo catalisador. As pontas poderão abrigar velhos perfis radicais, sem grandes consequências, como figuras do PSTU e de entes nanicos.

Mas há protagonistas que pleiteiam disputar o canto esquerdo, dentre elas, Marina Silva e Ciro Gomes. A ex-seringueira possui um perfil asséptico, como legítima representante do ambientalismo, tem credibilidade. Parece, no entanto, não ter estofo para aguentar dura e sangrenta batalha pela Presidência. Ciro Gomes, saindo pelo PDT, ganharia boa votação no Nordeste, mas tende a ser corroído por bolsões do Sudeste. Ciro é uma metralhadora ambulante. Tem um arsenal expressivo que acaba minando suas chances.

Vale recordar que os perfis de centro teriam condições de puxar pedaços de blocos tanto da direita quanto da esquerda. Ou seja, quando falamos de centro, entenda-se o espaço que se estende ao centro-direita ou ao centro-esquerda. Quem seria esse figurante?

Comecemos pelos quadros que já se mostram como pré-candidatos: Geraldo Alckmin e João Doria. Ambos preenchem espaços do centro à direita. Geraldo tem história no PSDB, identifica-se com valores do equilíbrio, ponderação, seriedade, positiva imagem pessoal. É criticado por lhe faltar determinação. Há dúvidas sobre o leque de alianças que formaria.

Doria tende a ser visto como a "novidade", a estampa contemporânea, o perfil que incorpora demandas do momento, a partir do conceito de "bom gestor", como tenta ser. Se conseguir ser o candidato tucano, tem condições de fechar grande arco de alianças. E José Serra? Debilitado, não disporia de fôlego para uma campanha presidencial.

Restaria, por último, Henrique Meirelles, cuja candidatura dependeria do sucesso da economia e consequente apoio de partidos grandes e médios, a começar pelo PMDB. Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF, teria imensa visibilidade, mas não tem "fígado" para suportar uma campanha. Fala-se de Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, poeta, advogado, pessoa admirável. Toparia? Muito difícil.
 

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