Justiça

Reginaldo Villazón

O caso do ex-motorista pernambucano Marcos Mariano da Silva é um exemplo de como as leis podem funcionar. Em 1976, aos 28 anos, ele foi preso por assassinato, confundido com o homem de mesmo nome que praticou o crime. Saiu do presídio seis anos depois, quando o verdadeiro culpado confessou o crime. Ficou livre, três anos. Em 1985 foi detido no caminhão que dirigia, numa abordagem policial. Novo engano legal, voltou ao presídio. Foi libertado treze anos depois, graças a uma revisão nos arquivos do presídio.

Após os 19 anos de prisão, retomou a vida livre em condições difíceis: 50 anos de idade, cego, tuberculoso e desempregado. Morreu em 2011, aos 63 anos, em casa, de infarto quando dormia. Mas as leis podem ser aplicadas com resultados opostos a estes. Por exemplo. Em 1995, no Rio de Janeiro, após divertir-se numa boate, um jogador de futebol causou um acidente por dirigir seu carro em alta velocidade. Houve mortos e feridos. Em 1999, ele foi condenado. Após 12 anos de recursos legais, seus crimes foram extintos por prescrição.

Casos como estes acontecem no mundo todo. Podemos classificá-los sob os títulos de erros, eventualidades, discriminações e outros. Os rótulos pouco importam. Certo é que as leis são feitas, com o apoio de juristas de alto nível, com o objetivo de promover justiça a todos os cidadãos. Mas elassão não aplicadas de forma automática. Ao contrário, dependem da ação de policiais, peritos, advogados, promotores, juízes. É como fazer bolo: uma receita gera bolos de qualidades diferentes nas mãos de confeiteiros diferentes.

Nós estamos acostumados a ver, de um lado, juristas e promotores com ares puristas de obediência absoluta às letras das leis. De outro lado, acusados e advogados em atitudes cínicas, usando mentiras descabeladas para encobrir delitos e influenciar a opinião pública. Esta situação tem favorecido os acusados ricos, que têm dinheiro para contratar advogados caros. Felizmente, esta realidade começou a mudar em 2012 com o julgamento do Escândalo do Mensalão no STF, no qual o ministro Joaquim Barbosa peitou advogados famosos.

A sociedade não deseja punição de inocentes e absolvição de culpados, mas o que é justo. O apego às leis, muitas vezes, despreza evidências gritantes porque elas, tecnicamente, não são provas. Permite que o amplo direito de defesa se transforme num vale tudo indecente. Faculta à presunção de inocência avalizar honra a canalhas. Sem dúvida, é preciso muito cuidado, pois é melhor absolver um culpado do que punir um inocente. Bom é que a ação de juízes e promotores com foco na justiça mostra resultados salutares.

Hoje nosso país atravessa um túnel assustador. Mas o número de pessoas que saem às ruas para defender o bem cresce e supera o das pessoas obliteradas pela ignorância. As pessoas ordeiras, defensoras de um país melhor para todos, colocam suas energias e esperanças nos servidores da justiça que se esforçam em tirar o país de mãos irresponsáveis. Nós precisamos melhorar muita coisa: os serviços públicos, o sistema prisional, as oportunidades de trabalho. Agora, tudo é urgente. Tudo tem que ser, como se diz, encarado de frente.

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