Pensar certo, por Reginaldo Villazón

O que não falta neste mundo é notícia ruim. Nos últimos anos, reportagens se repetem sobre um assunto desagradável. No Nordeste brasileiro, grandes quantidades de jumentos perambulam sem rumo pelas cidades e rodovias. Eles são abandonados pelos donos – bafejados pelo progresso econômico – que os estão trocando por motos e automóveis. Em consequência, os animais rejeitados sofrem total falta de cuidados. Muitos morrem de atropelamento nas vias urbanas e nas rodovias. Acontecem acidentes graves.

Há mais de uma década, a Região Nordeste recebe bons investimentos. Empresas do Brasil e do exterior viram oportunidades promissoras de operar na região, onde há mão-de-obra barata, recursos naturais disponíveis e grande mercado de consumo. Além disso, a criatividade nordestina ajuda a multiplicar a indústria e o comércio. O cenário é de progresso econômico, ainda que incipiente. Porém, o progresso econômico nunca pode ser visto isolado, fechado, independente. Ele está ligado a outros assuntos, obrigatoriamente.

Falando claro. É errado o descarte econômico dos jumentos por abandono. É errado que autoridades governamentais não aviem soluções e homens práticos aconselhem o abate geral para abastecer zoológicos e penitenciárias. Isto é pior que o sacrifício de crianças deficientes nas sociedades primitivas, porque não é necessário nem compatível com o nível evolutivo atual da sociedade. Os jumentos são dóceis, fortes, eficientes e produtivos. Têm sensibilidades físicas e psicológicas. E, segundo Luiz Gonzaga, "o jumento é nosso irmão".

A visão do progresso econômico, limitada aos aspectos econômicos, recebe críticas. Com razão, é fácil entender que o progresso econômico de um país ou região está ligado a tudo: clima, natureza, extensão da área, tamanho da população, etnia, religião, educação, iniciativa, política e assim por diante. Por isto, há nordestinos que preferem cuidar bem dos seus jumentos e mantê-los na lida apropriada, não se deixando arrastar por ilusões. Preferem não aumentar as estatísticas de dirigir sem habilitação e sofrer acidentes.

O notável educador brasileiro Paulo Freire (1921 – 1997) advertiu que há jeito de pensar errado e jeito de pensar certo. "Pensar mecanicamente é pensar errado. Pensar certo é procurar descobrir e entender o que está mais escondido nas coisas e nos fatos que observamos." O sociólogo francês Edgar Morin (1921) acrescenta: "Para pensar certo é preciso reunir os diversos conhecimentos e não analisá-los separadamente." Outros cientistas alertam que "o pensamento sistêmico permite entender as relações entre diversas áreas do saber".

É difícil pensar correto. Nós somos induzidos a pensar de forma fragmentada. Todos os dias, montadoras de veículos, fabricantes de cerveja, partidos políticos, líderes religiosos, comentaristas de futebol e outros difundem suas mensagens. Cada um com seu foco. A atenção do povo é fatiada. Daí, os arrastamentos. As fixações e as negligências. Não é fácil nos satisfazer sem abrir mão de convicções. Não é fácil manter a lucidez.

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