Quando falta dinheiro... por José Renato Nalini


 
...entram a criatividade, o engenho e a inovação. É o que a Justiça de São Paulo tenta fazer para driblar a crise orçamentária. Primeiro, convocando a sociedade bandeirante a repensar o sistema Justiça. O grande complexo que envolve a Magistratura, o Ministério Público, a Defensoria Pública, as Procuradorias, a Advocacia, as Polícias, as delegações extrajudiciais, antigos cartórios e a administração penitenciária. A resposta clássica à desfuncionalidade do Judiciário é a falta de mais juízes, mais funcionários, mais estruturas. Só que a crise afasta qualquer possibilidade de atendimento a essas demandas, por mais justas elas transpareçam.

Resta enfrentar os desafios com aquilo que é possível fazer, a despeito da extrema carência de recursos financeiros.

Nessa linha, o TJSP multiplicou os CEJUSCs, Centros Judiciais de Solução de Conflito e Cidadania. São núcleos de composição consensual de controvérsias, formados de maneira flexível e com a imprescindível colaboração de todo e qualquer parceiro interessado na disseminação de uma cultura de paz.

Em lugar de criar Varas, o CEJUSC pode suprir a falta de formalização da máquina judiciária e com extremo proveito. A experiência obtida nessa fórmula permitiu a constatação de que um CEJUSC equivaleria a 9 Varas Cíveis! Resultado muito auspicioso para uma economia anêmica e sem perspectivas de rápida recuperação, como é a nossa.

Outra inovação foi a audiência de custódia, resgate de uma obrigação que existe desde a década de setenta, quando firmado o Pacto de San José da Costa Rica, ratificado na Constituição de 1988 e internalizado em 1992. Demonstrou-se que 40% das prisões em flagrante não precisaram ser convertidas em preventivas. Com ganho na efetiva tutela da liberdade, o primeiro direito fundamental de fato, assim como explicitado na ordem fundante.

Os DEECRIMs – Departamentos Estaduais de Execução Criminal, instalados nas sedes das dez Regiões Administrativas, constituem um tratamento racional, adequado e otimizado à sensível questão do cumprimento das penas. Dentro em breve, não haverá sentenciado preso além do prazo, nem pleito de benefício legal sem apreciação oportuna.

Multiplicam-se os Anexos da Violência Doméstica, substitutivo a inviáveis novas Varas, assim como o Anexo da Violência em Estádios, tudo com a colaboração efetiva dos magistrados que acumulam funções, aceitam nova formatação de sua atividade, o repto de assumir incumbências até então não enfrentadas, tudo com os préstimos insubstituíveis do patrimônio maior: o funcionalismo da família forense. E com a inestimável colaboração dos parceiros de sempre: o Ministério Público, a Defensoria, a Advocacia, as duas Polícias, a Administração Penitenciária, a Segurança Pública.

Conjunção favorável de pensamentos afinados com a necessidade de se oferecer o melhor justo possível, a despeito de situação calamitosa e de crescente gravidade.

A Justiça paulista não hesita em chamar a todos, ninguém excluído, para auxiliá-la a harmonizar o convívio. Justiça é também virtude, atributo que a sociedade precisa perseguir e que não é missão exclusiva dos profissionais da área jurídica.

O grau de civilização de uma sociedade também se afere pelo nível de litigância que ela ostenta. Nesse aspecto, o Brasil não está num ranking favorável. Mas nada impede que ele passe a ocupar um patamar mais compatível com o esforço que tantos brasileiros despendem no sentido da edificação de uma nação mais fraterna e solidária.

José Renato Nalini é presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo

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