Orquestra se apresenta de graça na rua para pedir socorro contra crise


 
Sem receber há quase sete meses e prestes a desistir do trabalho, músicos da Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto (SP) estão tocando gratuitamente nas ruas para pedir socorro. Com o objetivo de arrecadar fundos e tentar controlar a crise que se arrasta desde 2013, agravada pela ausência de patrocinadores e verbas do poder público, grupos estão se apresentando ao ar livre e sem horário planejado em diferentes bairros.
As interveções fazem parte de uma campanha que também prevê a realização de um concerto com o maestro João Carlos Martins em 21 de julho.
"A gente precisa realmente que as pessoas se comovam e ajudem a orquestra para que ela se mantenha viva. Também espero que o poder público faça alguma coisa por nós, porque a orquestra que está se perdendo", afirma o trompetista Nataniel Tomás, que nos últimos meses também trabalhou de mototaxista e vendeu alguns instrumentos para pagar as contas.
Com 94 anos de história, a Orquestra Sinfônica de Ribeirão é uma iniciativa pública, administrada pela Associação Musical de Ribeirão Preto, que depende de patrocinadores e programas de incentivo para se manter. Contudo, diante da crise enfrentada pelo país, os investimentos na instituição diminuíram provocando uma dívida que ultrapassa R$ 1,5 milhão.
Em abril, a orquestra parou uma apresentação da série "Concertos Internacionais" para fazer um alerta. Os músicos largaram seus instrumentos e deixaram o palco do Theatro Pedro II por alguns minutos para, em seguida, retornarem com cartazes, reclamando da falta de salários.
‘S.O.S. Orquestra Ribeirão’
Diante da situação, a professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo, Cláudia Souza Passador, que atualmente também integra a gestão da orquestra, organizou a campanha "S.O.S Orquestra Ribeirão", com o intuito de arrecadar fundos para a instituição.
O projeto foi lançado durante a abertura da 15° Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto, no Theatro Pedro II.
"Quando eu vi o que estava acontecendo com os músicos da orquestra e a situação grave financeira que eles estavam enfrentando, achei que alguém tinha que fazer alguma coisa. A campanha tem algumas frentes. Uma é chamar a atenção e atrair novos parceiros. A outra é atrair pessoas comuns para participar da vida da orquestra", diz.
Entre as ações da campanha, estão as apresentações ao ar livre em diferentes pontos da cidade. Nesta segunda-feira (15), a manifestação aconteceu em frente a condomínios da Avenida João Fiúsa, na zona sul.
Embora a intenção seja arrecadar verba, as apresentações também se tornaram uma forma de levar música clássica a quem nunca ouviu. "Eu nunca tinha ouvido. Foi a primeira vez. Fiquei até emocionada. Tomara que eles venham mais vezes", afirma a faxineira Simone Carmo dos Santos.
O sentimento também contagiou a porteira Cleide Botelho, que em poucos minutos descobriu a importância de ajudar a orquestra. "Não pode parar não. Vai ser triste se parar. Tem que todo mundo se unir, juntas as forças, para incentivar a orquestra".
Está todo mundo com muita dificuldade. Músico atrasando o aluguel, já teve músico despejado de casa, que teve vender o carro, o instrumento, pedir ajuda para tudo quanto é lado. Chega uma hora em que as portas começam a se fechar e você não consegue mais oportunidades"
Como parte da campanha, foi marcado para 21 de julho um concerto com o maestro João Carlos Martins, cuja verba arrecadada será destinada ao pagamento dos músicos. A apresentação está programada para acontecer às 21h no Theatro Pedro II.
"Uma cidade com o PIB de Ribeirão Preto não pode aceitar que a orquestra suma ou que os músicos tenham que almoçar pão com manteiga. Os músicos têm que ser respeitado", afirma Cláudia.
Falta de verbas
A crise se intensificou em meados de novembro, quando os primeiros salários dos músicos deixaram de ser efetuados. "É novembro, dezembro, o 13º salário, e nesse ano, março, abril, maio e estamos a caminho do sétimo salário atrasado", diz o violinista Arthur Lauton.
Além da diminuição do número de patrocinadores, a orquestra enfrenta problemas com verbas até então adquiridas pela Lei Rouanet, programa de incentivo fiscal do Ministério da Cultura, e do Programa de Ação Cultural (ProAC), da Secretaria de Estado da Cultura.
Se no ano passado foram captados R$ 2 milhões em recursos com o programa do governo – apesar dos gastos anuais da orquestra serem estimados em R$ 4 milhões –, este ano a verba ainda não superou os R$ 100 mil. "Esse valor ainda está preso porque precisa ter um doze avos do total para começar a utilizá-lo. Então a gente não pode usar nem o pouquinho que tem. A gente realmente precisa muito da ajuda de onde puder vir", explica.
Por outro lado, o auxílio dado anteriormente pela Prefeitura também foi suspenso. Em nota, a administração municipal informou que cancelou o repasse anual de R$ 500 mil devido a um plano de corte de gastos, e alegou que a Sinfônica é particular e não possui vínculo com a Prefeitura.

Enquanto isso, a instituição que já teve 66 músicos conta agora com 50 profissionais que também cogitam a possibilidade de desistir do projeto. "Está todo mundo com muita dificuldade. Músico atrasando o aluguel, já teve músico despejado de casa, que teve vender o carro, o instrumento, pedir ajuda para tudo quanto é lado. Chega uma hora em que as portas começam a se fechar e você não consegue mais oportunidades", conta o músico Fernando Chagas Correa.

Do G1 Ribeirão e Franca
EPTV Ribeirão Preto
Fotos
Carlos Trinca/EPTV


 
 

 

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