Harmonia descuidada, por Reginaldo Villazón

Paris, última quarta-feira (07), 11:30 horas. Na sede do jornal satírico "Charlie Hebdo", no centro da cidade, acontecia a reunião semanal da pauta de assuntos. Dois homens encapuzados vestidos de preto, portando fuzis automáticos, invadiram o prédio e executaram com frieza uma chacina. Deixaram 12 mortos e 11 feridos. Terminado o ataque, fugiram num carro que os esperava com um terceiro homem. Após uma perseguição policial frustrada, os dois atiradores continuaram em fuga e o motorista entregou-se.
Os suspeitos foram identificados, pertencentes ao movimento islâmico fundamentalista. Os atiradores, Chérif Kouachi (34 anos) e Said Kouachi (32 anos), são irmãos nascidos na França, filhos de pais argelinos. O motorista, Hamid Mourad (18 anos), tem nacionalidade ainda desconhecida. Segundo testemunhas, durante o atentado os autores gritavam "Vingamos o Profeta", certamente referindo-se ao profeta Maomé, satirizado numa série de charges pelo jornal em 2006. Desde então, o jornal vivia sob ameaças.
As manifestações dos políticos, jornalistas e juristas foram exatamente iguais, no mundo todo. Eles condenaram a violência e defenderam a liberdade de expressão. Afirmaram que na democracia deve haver liberdade e tolerância. Em Paris, 150 mil pessoas foram às ruas na defesa do jornal. Na realidade, trata-se de um jornal semanal sem compromissos sérios de democracia, liberdade e tolerância. Faz sátiras pesadas sem medir consequências – inclusive sobre religiões – e conta com advogados para sua defesa.
Neste mundo cão, muitas vezes, a democracia é utilizada para fazer guerras. A liberdade de expressão é empregada para converter as pessoas. A tolerância é exigida para reprimir. Além disso, munir-se de advogados e achar que tudo deve ser resolvido segundo as leis, é atitude infantil. Na vida normal das pessoas, é comum observar se alguém se sentiu ofendido por algum gesto ou palavra. A educação e o respeito ensejam uma explicação ou um pedido de desculpa. Bons jornais e revistas fazem isto com muita dignidade.
Segundo os juristas, todo cidadão pode fazer o que tem direito em lei. E mais, o que tem liberdade de fazer por não haver proibição em lei. No entanto, isto não basta para fazer. Um bom exemplo é sobre o comportamento dos motoristas no trânsito. As autoridades reconhecem que a educação no trânsito, em vez do apego irrestrito às regras, facilita a circulação dos veículos e evitar acidentes. Da mesma forma, não reagir a um assalto pode salvar vidas. Cutucar onça com vara curta também é uma ação que deve ser evitada.
A hipocrisia ostentada pode levar os europeus a outras tragédias. As fronteiras entre os países não são rígidas como antes. É impossível sustar a entrada de imigrantes. O aumento de estrangeiros na Europa, inclusive muçulmanos, é uma realidade. As sátiras e atitudes do jornal "Charlie Hebdo" não contribuem para a paz. Muito ao contrário. Para piorar a situação, europeus legítimos começam a mudar de lado. E o eficiente fuzil automático russo AK-47, usado pelos terroristas, é fácil de comprar, barato e simples de usar.

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