O futuro da educação, por José Renato Nalini

 
Em seus "Ensaios", Montaigne há cinco séculos criticava a fórmula de ensino então adotada. E ela quase não mudou. Aulas prelecionais, alguém falando para dezenas de educandos distintos. Cada qual com um temperamento, uma família, hábitos e idiossincrasias diferentes. Depois estranha-se quando apenas alguns dentre eles deem certo.

O que estamos fazendo com a educação? Transmitindo dados, fazendo com que a criança decore e treine memorização. Sem a menor noção de uso inteligente dessas informações em sua vida. Sem a preocupação de fazê-la feliz.

Por isso é que a educação quase sempre deseduca. No sentido de tornar-se maçante, desinteressante, chata, insossa. O indivíduo não é respeitado. Procura-se moldá-lo de acordo com um padrão que já não vigora.

Quem já não notou que crianças muito bem dotadas não se acostumam com o regime escolar? Hiperativas, irrequietas, mereceriam atenção especial, exatamente porque são potencialmente ilimitadas. Podem atingir os píncaros de um desenvolvimento que a escola não sabe administrar. Ficam e terminam seus cursos os mais limitados, os que não se indignam, os que se curvam e, lamentavelmente, os medíocres.

É óbvio que há exceções. Mas uma educação que priorizasse as individualidades daria muito mais certo. Não seria preciso a reunião de especialistas do mundo inteiro para concluir que o ensino do futuro será uma espécie de monitoramento do jovem, com os professores como tutores e não como os "donos da verdade". É preciso incutir na criança a vontade de ler, de pesquisar, de descobrir ela própria a maravilha do universo. Não doutriná-la e deixá-la despersonalizada, a repetir bobagens que, até o momento, são consideradas como integrantes do processo educacional.

O pior é que o modelo de transmissão do conhecimento por alguém considerado detentor exclusivo do acervo de verdades já detectado pela ciência vai sendo replicado nos demais graus da escolarização convencional. O trágico ocorre nos Cursos de Direito, que são mais numerosos no Brasil do que a soma de todos eles existentes no restante do mundo. De que adianta espalhar bacharéis em ciências jurídicas por este País, se a sensação de impunidade e injustiça é o que mais habita as consciências lúcidas ainda suscetíveis de serem tomadas por indignação? *José Renato Nalini é presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo

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