Algo estranho no ar, por Vitor Sapienza

 
Por mais ingênuo que possa parecer o observador, percebe-se que algo anormal vem ocorrendo nas grandes cidades brasileiras. E isso vai, aos poucos, se estendendo às pequenas comunidades, sinal de que o problema pode ser maior do que imaginamos. E quando isso acontece, fica nítido que não prestamos atenção a pequenos detalhes, pequenos indícios, e o que era pequeno acaba ganhando proporções que certamente trarão dificuldades.
Quando começou a crescer o consumo de bebidas entre os jovens, foram muitos os que diziam que era mais uma conquista da juventude, na busca por mais espaço na sociedade. O resultado está fácil de ser detectado, basta olharmos as conseqüências disso no trânsito, na família, no trabalho. E esse problema, o alcoolismo, atinge cada vez mais os jovens.
Depois dos protestos ocorridos no ano passado, quando o aumento das passagens de ônibus serviu de pretexto para a mobilização, o que vemos agora vai muito além do que se possa imaginar. Ao mínimo descontentamento de alguns, e muitas vezes instigados por interesses escusos, muita gente já não hesita em ocupar ruas e avenidas, parando o trânsito e provocando grandes prejuízos à população.
Fica nítido que todos reivindicam direitos, mas quase sempre deixa-se de lado os deveres. O direito de protestar é livre, assim como o direito de ir e vir dos demais. O que não se compreende é que, usando vários subterfúgios, meia dúzia de pessoas possam paralisar o trânsito de uma cidade, sem que os demais possam manifestar os seus dramas, as suas preocupações, os seus prejuízos.
E o que era comum nas grandes cidades, se estende para as pequenas e até nas regiões mais afastadas. No país da pirataria, o falso sem-terra mistura-se com o falso sem-teto e viram massa de manobra de alguns ainda "sem-poder", mas dispostos a conquistá-lo, custe o que custar. Lutam pelo que dizem ser um direito do homem da terra enquanto escondem o que seria a grande característica do homem do campo: os calos nas mãos.
Falsos caciques, falsos pajés, falsos índios, falsos curumins. A roupagem muitas vezes traz a grife da multinacional. O tambor deu lugar ao equipamento de tecnologia de ponta e o baton substitui a simplicidade do urucum; a demarcação de terras é o pretexto, mas a voz não é a voz do povo da mata. Ela tem sotaque e objetivos escusos que podem ser facilmente traduzidos: extração irregular de minérios, pirataria biológica, extração de espécies da flora e fauna, a pirataria fitoterápica e muitos outros.
Os pequenos indícios estão aí, traduzidos pelos mais variados argumentos onde predominam a desordem e o desrespeito aos demais. Resta saber até quando as tais ONGs continuarão a falar pelos nossos índios, os sem-teto, os sem-terra, os sem-argumentos e os sem-noção irão menosprezar a nossa legislação, a nossa inteligência, a nossa paciência. Nesse emaranhado de dúvidas, não sabemos se a sociedade acordou, ou acredita que ganhou asas e quer ensaiar os primeiros vôos. Resta saber se para o alto ou para o abismo.
*Vitor Sapienza é ex-presidente da Assembleia Legislativa de SP. www.vitorsapienza.com.br     

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