O peso da tradição



A prefeita de Jales, Eunice Mistilides Silva, completa seu primeiro ano de governo em 31 de dezembro de 2013. No discurso de posse, no primeiro dia do ano, no auditório da Câmara Municipal, Eunice comemorou o fato histórico de a primeira mulher ocupar o cargo no município. Destacou o apoio recebido dos seus partidários e da população, reconheceu a necessidade de exercer liderança política e contar com participação da população para realizar as aspirações da comunidade. Afirmou que o esforço é tarefa de todos.

Na mesma ocasião, a prefeita deixou claro que sabia das dificuldades que teria que enfrentar e o tamanho da sua responsabilidade, reafirmando suas falas durante a campanha eleitoral. Admitiu que não poderia se permitir atitudes alheias ao bem-comum, assim como os políticos opositores deveriam evitar entraves desnecessários ao seu governo. Na convivência política, valorizou o diálogo, a colaboração e o respeito.

Este primeiro ano da prefeita Eunice serviu para desfazer o receio de uma minoria dos cidadãos sobre a capacidade de mando de uma mulher na Prefeitura. Tanto quanto Dilma Rousseff é presidente do Brasil (desde 2011), Eunice é integralmente prefeita de Jales. Assumiu a Prefeitura com a dívida de R$ 75 milhões e apenas R$ 10 milhões para receber como dívida ativa, mas não se esmoreceu e corre atrás de recursos para resolver problemas do município. Soube se defender da oposição sistemática que não se entende.

No entanto, há queixas de eleitores, mesmo entre os que colocaram suas esperanças nas propostas da prefeita. O perfil do secretariado escolhido é avaliado como do tipo que só fala amém. O modelo de gestão da prefeita é visto como centralizador e dominador, que busca passar todos os assuntos sob o seu crivo e rechaçar as opiniões contrárias. Sobre sua presença na comunidade, é percebida como sendo estimulada para visibilidade em todos os eventos.

Verdade seja dita. Atacar ou defender, injuriar ou justificar o primeiro ano de mandato da prefeita Eunice é pura perda de tempo. Ao povo, esses procedimentos nunca produzem benefícios. Aos políticos, da situação e da oposição, essas práticas tornam a política mais confusa e ineficiente. Porém, é bom e oportuno analisar o assunto, começando por uma justa indagação. Por que a prefeita Eunice, que mostra saber perfeitamente o que fazer na administração municipal, gastou um quarto do seu mandato abaixo da sua sabedoria?

Há uma resposta simples. É muito difícil converter o discurso correto na prática correta, num ambiente contaminado por práticas antigas, antiquadas e rançosas. Isto é indubitável. As eleições de 2012 envolveram seis candidatos a prefeito e vice-prefeito, todos graduados em cursos superiores, mas com profissões convencionais. As três coligações, com nomes bem-comportados, foram apoiadas por dezoito partidos políticos. Foi neste ambiente, nada propício para inovações, que a candidata Eunice foi eleita por expectativa de mudanças.

Já no governo, como enfrentar os problemas urbanos – saúde, educação, lazer, limpeza, trânsito – dentro de um sistema político-administrativo carregado de normas e comportamentos arcaicos, uma alienação contemporânea? Como promover a qualidade, a produtividade e a criatividade dos funcionários da Prefeitura, visando inclusive à economia financeira por combate aos desperdícios? Como organizar mutirões comunitários, ações sociais e projetos grupais, muito ao gosto dos jovens, que acabam arrastando os adultos? São poucos os políticos inovadores que realizam estes empreendimentos com sucesso. Mas eles existem.

É óbvio que prefeita Eunice tem ciência do que é correto fazer. Porém, rende-se ao peso da tradição política, instalada ao longo das décadas por políticos autoritários. Para adotar posturas novas e produtivas, o remédio não é o confronto (dentro e fora dos partidos), mas a articulação política. A época é propícia aos políticos que desejam fazer sucesso, porque a classe política está viciada na tradição e nas questões partidárias. Suas falas e atitudes não inspiram, não convencem e não mobilizam o povo para as mudanças que o povo quer.

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