Rui Tavares lança Hipocritões e olhigarcas no Brasil, livro que explica as guerras culturais desde a invenção da imprensa à era das redes sociais


Em 2026, ano de eleições, chega às livrarias Hipocritões e olhigarcas: passado e futuro das guerras culturais, novo livro do historiador português Rui Tavares. A editora Tinta-da-China Brasil já iniciou a pré-venda da obra, com lançamento previsto para março. O livro percorre séculos de história, de Lutero a Donald Trump, da invenção da imprensa à era das redes sociais, identificando as guerras culturais que atravessaram a modernidade e apontando caminhos para superá-las.

O lançamento chega em boa hora para iluminar o debate público, no começo de 2026, ano eleitoral no Brasil e Portugal. Dez anos depois do impeachment de Dilma Rousseff, a polarização que tomou conta da vida cultural e política do Brasil segue viva e merece constante reflexão. Todos já nos vimos envolvidos em alguma guerra cultural, mesmo que não saibamos muito bem de que se trata.


Hipocritões e olhigarcas: passado e futuro das guerras culturais
Divulgação

Hipocritões e olhigarcas reúne cinco aulas que Rui Tavares deu no curso “Guerras culturais: outrora e agora, aqui e lá fora”, na escola on-line da Tinta-da-china portuguesa e do jornal Público, além de algumas reflexões publicadas em crônicas da Folha de S.Paulo e do Expresso. Rui Tavares é historiador, escritor, cientista social e deputado, cofundador do partido Livre em Portugal, podcaster, autor de Agora, agora e mais agora (Tinta-da-China Brasil, 2024), entre outros livros, e vive com um pé no Brasil: além de sua coluna na Folha de S.Paulo, colaborou no roteiro de Apocalipse nos trópicos, de Petra Costa.

Mas o que, afinal, são guerras culturais? 

Conforme a definição do autor, as guerras culturais são fenômenos de polarização extrema em torno de identidades, valores e narrativas, que geram grande intensidade emocional. Em meio a uma guerra cultural, ninguém pode ficar de fora — todo mundo precisa ter uma opinião e manifestá-la, mesmo que o tema do debate não mude tanto a vida das pessoas. A partir dessa definição, muitos podem achar que se trata de um fenômeno recente, próprio da nossa experiência contemporânea nas redes sociais, mas Tavares nos mostra que as guerras culturais já existem há muito tempo, e só foram tomando formas diferentes ao longo dos séculos.

A invenção da imprensa no século 15 por Gutenberg, por exemplo, que levou à proliferação de impressores e publicações nos séculos seguintes, gerou reações ambivalentes. Embora a princípio os frutos tenham sido comemorados, já que os livros se tornaram mais acessíveis, logo vieram críticas a essa nova forma de leitura extensiva (cada pessoa podia ter vários livros e lê-los uma vez só) em oposição à leitura intensiva praticada antes (cada pessoa tinha um único livro, que era lido várias vezes). A abundância de livros passa a ser vista com desconfiança, e assim se abre caminho para a censura, uma forma de selecionar o que as pessoas deveriam e o que não deveriam ler, qual leitura era ou não útil, em meio ao mar de livros disponíveis. Além disso, com o advento da imprensa, veio também outra guerra, uma guerra tipográfica: enquanto Martinho Lutero defendia o uso de asteriscos para sinalizar notas, Johann Eck insistia na utilização de obeliscos, pequenas cruzes. Essa batalha de símbolos, que representava também uma batalha teológica entre o protestantismo e o catolicismo, se tornou protagonista de livros e de debates da época.

Com o Iluminismo, nos séculos 17 e 18, outra guerra cultural provoca uma mudança de mentalidade. Se um raio ou um terremoto eram antes entendidos como castigos de Deus, eles passam agora a ser interpretados como fenômenos da natureza, o que implica um novo olhar para a suposta predestinação divina dos reis e outros líderes supremos — mudança que tem como última consequência a Revolução Francesa. Nos séculos 19 e 20, casos como o Dreyfus e o Mortara envolvem antissemitismo, crenças, identidades e narrativas, e dividem a sociedade da época. 

Questionando a ideia de Marshall McLuhan de que “o meio é a mensagem”, Tavares diz que uma mensagem forte é capaz de subverter essa noção e atravessar diversos meios. Um exemplo emblemático é o de um Minotauro desenhado por uma criança numa parede de Pompeia. O mito é uma dessas mensagens fortes que sobrevivem a milênios: transitou da oralidade na Grécia Antiga para brincadeiras de criança em Pompeia, e até hoje circula em inúmeras aulas, livros e canções. 

Como mostra o caso da imprensa de Gutenberg, as guerras culturais muitas vezes nascem de inovações tecnológicas ou são potencializadas por elas. Mas Tavares questiona a ideia de que a Primavera Árabe seja uma revolução feita via Twitter, que o nazismo tenha se propagado só por causa do rádio e que o populismo exista como efeito inevitável das redes sociais. É claro que essas tecnologias dão um empurrãozinho, mas os discursos em questão são em si magnéticos, geram polarizações e por isso transitam bem entre vários meios.

Como saída para as guerras culturais, o autor aponta o desejo político. Tomando como exemplo Roosevelt, um líder que conseguiu ativar esse desejo com políticas sociais, Tavares vislumbra uma forma de sair do impasse das polarizações, que costumam girar em torno de temas sem relevância no dia a dia das pessoas: trazendo o foco para o desejo político. O que podemos desejar para melhorar nossa vida aqui e agora?

O autor, que testemunhou o movimento que levou ao impeachment de Dilma Rousseff dez anos atrás e colaborou no roteiro do filme Apocalipse nos trópicos, de Petra Costa, se debruça também sobre o Brasil em seu novo livro. Para o deputado, que é um dos fundadores do partido LIVRE em Lisboa, o neopentecostalismo no Brasil é uma forma de sequestrar o desejo político, já que o discurso dirigido aos fiéis afirma que as mudanças sociais que impactaram a vida deles na verdade vieram da ação de Deus, e não por meio de políticas públicas. Só retomando o desejo político, defende o autor, será possível fugir do labirinto das guerras culturais.

O título do livro provém de dois neologismos cunhados pelo autor para dar conta de duas figuras inomináveis que assombram o presente: Donald Trump, o hipocritão que fala contra a corrupção, mas cria uma moeda com seu próprio nome assim que assume o cargo, facilitando todo tipo de suborno; e Elon Musk, o olhigarca que acumula dinheiro e expande seus “tentáculos de influência” por todas as áreas da sociedade, além de nos vigiar e influenciar com seus algoritmos. Esses contraexemplos se desdobram, naturalmente, em outros “monstros da falsidade e do poder desmedido”.

Com a condução de um erudito e humanista, Hipocritões e olhigarcas é um livro essencial para conhecer melhor nosso passado, entender os labirintos do presente e vislumbrar saídas para o futuro.

Sobre o autor
Rui Tavares (Lisboa, 1972) é formado em história pela Universidade Nova de Lisboa, com mestrado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e doutorado pela École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris. Escreveu vários livros, entre eles O pequeno livro do Grande Terremoto (vencedor do prêmio rtp/Público de melhor ensaio em 2005, publicado no Brasil pela Tinta-da-China Brasil em 2022) e O censor iluminado (premiado pela Academia da História Portuguesa como melhor livro de história de Portugal em 2019). É o autor do programa televisivo de divulgação histórica Memória fotográfica (rtp, 2018) e do podcast de história Agora, agora e mais agora, também publicado em livro pela Tinta-da-China Brasil em 2024, e coordenou a Coleção Portugal: Uma Retrospectiva. Atualmente, é deputado na Assembleia da República pelo partido livre. Dele, a Tinta-da-China Brasil publicou ainda Esquerda e direita: guia histórico para o século XXI (2016). 

Título: Hipocritões e olhigarcas: passado e futuro das guerras culturais
Autor: Rui Tavares
Data de lançamento: Março/2026
Capa: Vera Tavares
Páginas: 184 pp
ISBN: 978-65-84835-61-0
Formato: Brochura, bolso, 13 x 18,5 cm
Preço: R$ 79,90

Sobre a Tinta-da-China Brasil
Tinta-da-China Brasil foi fundada em 2012, no Rio de Janeiro, por Bárbara Bulhosa, para trazer para o país a excelência da casa fundada em 2005 em Lisboa. Em 2022, a editora brasileira passou para os cuidados da Associação Quatro Cinco Um, em São Paulo, organização sem fins lucrativos voltada para a difusão do livro no Brasil, que deu prosseguimento ao projeto editorial, concentrado nos eixos de literatura, história e ciência, com desvios pelo humor, jornalismo, quadrinhos e crítica literária.

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