Umbu inspira novas descobertas científicas

 




 

Umbuzeiro e mandacaru

Pesquisa caracteriza polpa da fruta com análises avançadas e aponta usos que vão da saúde intestinal ao desenvolvimento de novos aromas


Estudo realizado em colaboração entre a Embrapa e cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), consolidou o umbu, fruto típico da Caatinga, como uma promissora matéria-prima.


O umbu (Spondias tuberosa Arruda), fruta nativa do semiárido brasileiro e símbolo da Caatinga, acaba de ter sua polpa caracterizada de forma abrangente em estudo científico inédito que integra técnicas avançadas de análise química e sensorial. Os resultados revelam que o fruto reúne compostos bioativos de alto valor, além de um perfil aromático singular, o que abre espaço para sua utilização em alimentos funcionais, cosméticos, fragrâncias e até medicamentos.


De acordo com a professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Juliane Welke, o trabalho investigou, pela primeira vez, tanto os compostos fenólicos extraíveis por métodos tradicionais de avaliação, quanto aqueles até então negligenciados, chamados de não extraíveis.


Segundo a doutoranda Rafaela Silveira, essa fração não extraível, foi responsável por impressionantes 82% do conteúdo total de polifenóis da polpa de umbu e demonstrou alta capacidade antioxidante.


"Isso significa que o umbu pode ajudar a neutralizar radicais livres, associados ao envelhecimento celular e a doenças crônico-degenerativas, como cânceres e doenças cardiovasculares", explica Silveira.


Foram identificados 19 compostos fenólicos e um ácido orgânico, com destaque para os flavonoides como miricetina, rutina, quercetina e kaempferol – moléculas já reconhecidas pela ciência por seus efeitos anti-inflamatórios, cardioprotetores e até pela atuação no combate ao estresse oxidativo.


Essas substâncias reforçam o potencial do fruto como ingrediente de produtos que vão além da alimentação, alcançando aplicações farmacêuticas.

No campo dos aromas, o estudo encontrou 26 terpenos, além de álcoois, ésteres, ácidos, aldeídos e cetonas. Compostos como citral, β-linalol, nerol e p-cimeno são os principais responsáveis pelo aroma exótico do umbu, que mistura notas cítricas, florais e doces.


O perfil aromático diferenciado justifica o interesse da indústria de alimentos e cosméticos em explorar a fruta como matéria-prima e coadjuvante para produtos inovadores. 


Além do apelo sensorial e funcional, segundo Aline Biasoto, pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente, o estudo aponta que o aproveitamento integral do umbu pode contribuir para a economia circular e para a geração de renda no semiárido nordestino, região historicamente afetada pela escassez hídrica. Hoje, a fruta é comercializada principalmente na forma de polpa, utilizada na produção de geleias, compotas, sorvetes, sucos, licores e cervejas por cooperativas locais. 


Potencial 


O umbuzeiro, capaz de armazenar água em suas raízes para sobreviver às secas prolongadas, é considerado um patrimônio cultural do semiárido. A coleta de seus frutos é tradicionalmente realizada por agricultores familiares, garantindo sustento a diversas comunidades no bioma Caatinga.


Saulo de Tarso Aidar, pesquisador da Embrapa Semiárido e coordenador do projeto “Uso e conservação da biodiversidade nativa da Caatinga ou adaptada ao bioma com potencial de uso frutífero e ornamental” (Finep nº 01.22.0614.00, referência 0230/19), acredita que com essa nova caracterização científica, o fruto ganha respaldo, podendo vir a conquistar novos mercados e ampliar o impacto socioeconômico da espécie.


Segundo os pesquisadores, estudos futuros devem aprofundar o papel dos compostos fenólicos do umbu na saúde intestinal e avaliar aplicações específicas do fruto em alimentos funcionais e suplementos. No campo dos aromas, a diversidade de terpenos identificados mostra o potencial da fruta em produtos cosméticos e alimentícios.


Ao revelar a riqueza bioquímica e aromática do umbu, o estudo reposiciona a fruta, até então subutilizada e com altas perdas pós-colheita, como matéria-prima estratégica para inovação industrial. A ciência, mais uma vez, mostra que o semiárido brasileiro pode ser fonte de soluções sustentáveis que unem saúde, sabor e tradição cultural.


Outras linhas de pesquisa com o umbuzeiro


Além dos trabalhos voltados à caracterização da polpa de umbu, outras frentes de pesquisa vêm sendo conduzidas com a espécie, com foco na viabilização do plantio comercial do umbuzeiro. Entre os avanços mais relevantes está o desenvolvimento e o registro, em 2019, das primeiras cultivares melhoradas no Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). São quatro materiais lançados pela Embrapa: BRS 48, BRS 52, BRS 55 e BRS 68, todos com produtividade superior à média e adaptados às condições do bioma Caatinga.


Segundo o pesquisador Visêldo Ribeiro, da Embrapa Semiárido, que participou diretamente do desenvolvimento das cultivares, os novos materiais representam um passo importante na domesticação do umbuzeiro, reduzindo a dependência do extrativismo e ampliando as oportunidades de geração de renda para agricultores familiares.


Paralelamente, outra linha de pesquisa se dedica ao desenvolvimento de formulações e produtos que fortaleçam a cadeia produtiva do umbu, agregando valor ao fruto além do consumo in natura. Já bastante utilizado na produção de doces e geleias, o umbu também se tornou base para novos produtos, como um fermentado elaborado recentemente pela mesma equipe de pesquisadores, resultado de estudos que exploram o potencial sensorial e econômico da fruta na agroindústria.


O estudo, de Rafaela Silveira, UFRGS, Karolina Hernandes, UFRGS, Luana Mallmann, UFRGS, Viseldo Oliveira, Embrapa Semiárido, Cláudia Zini, UFRGS, Aline Biasoto, Embrapa Meio Ambiente e Juliane Elisa Welke, UFRGS, está disponível aqui.

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