Recursos hídricos, queimados e cinzas: a urgência do equilíbrio necessário na busca pela sustentabilidade ambiental

 

Foto: Arquivo Laboratório de Ecotoxicologia da Embrapa Cerrados


Lagoa Bonita, na Estação Ecológica Águas Emendadas (DF), após incêndio em 2010


Eduardo Cyrino Oliveira-Filho
Pesquisador da Embrapa Cerrados

A água e o fogo são elementos que não se misturam, mas que se influenciam e podem comprometer significativamente a saúde das pessoas e de toda a vida na Terra. A água é um elemento essencial para a vida, mas em excesso pode trazer várias consequências negativas, como os episódios de enchentes e alagamentos vistos recentemente no Brasil. O fogo já foi manipulado pelos povos primitivos há milhares de anos, e hoje é uma ferramenta fundamental para diversas atividades humanas. Contudo, se utilizado sem o controle necessário ou de formas criminosas, também pode ser extremamente nocivo e perigoso.

Resultados de estudos recentes mostram as interações entre esses dois elementos e, principalmente, as influências negativas do fogo sobre a água no nosso planeta. Vários artigos científicos relataram os efeitos das queimadas na redução da quantidade de água disponível, afetando, entre outros aspectos, a umidade do ar. Essas consequências estão amplamente relacionadas às mudanças climáticas e ao aquecimento global propriamente dito. 

E sobre a qualidade da água, o que se fala? Pouco. Como o fogo e a água não se misturam, são os resíduos deixados pelo fogo que interagem na água, causando interferências diretas e redução na sua qualidade.

Os impactos das cinzas de incêndios florestais sobre os recursos hídricos têm sido amplamente estudados em regiões temperadas, na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, o tema ganhou relevância no âmbito do projeto de pesquisa “Queimadas e recursos hídricos no Cerrado: efeitos das cinzas sobre aspectos limnológicos e ecotoxicológicos” (2010-2012) e, posteriormente, no “Projeto Cinzas: aspectos motivacionais de uso do fogo e efeitos sobre a água e o solo como subsídios para mitigação dessa prática na agricultura” (2013-2016), ambos liderados pela Embrapa Cerrados (DF) e financiados pelo Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica (CNPq). 

No entanto, ainda há muitas lacunas a serem preenchidas e várias questões a serem investigadas. O que se sabe é que as queimadas são eventos frequentes e naturais no Cerrado brasileiro, por exemplo, mas a ação humana tem ampliado a sua frequência e gerado diversos problemas ambientais. Além das perdas verificadas após o termo do fogo, efeitos não facilmente visíveis também são detectados. As cinzas e a fuligem gerada pelo fogo são compostas por elementos químicos constituintes de seres vivos queimados (vegetais ou animais) ou mesmo de materiais minerais, que podem ser degradados dependendo da intensidade do fogo. 

Com a chegada das chuvas, ou mesmo transportado pelo ar, parte desse material atinge os recursos hídricos, carreando uma série de elementos químicos capazes de alterar a qualidade da água, prejudicando seu grau de potabilidade e, principalmente, a sobrevivência das espécies que habitam os ecossistemas aquáticos. A presença de metais de macronutrientes como potássio, fósforo e nitrogênio, além de micronutrientes como vários, é marcante nas cinzas, e as quantidades disponíveis de cada um desses elementos são o aspecto de maior relevância para a determinação das consequências. 

Em contato com a água, parte desses compostos se dissolvem, alterando diversos parâmetros físico-químicos do meio aquático, entre eles o pH e a deficiência auditiva, fatores limitantes para a sobrevivência de algumas espécies. Nesse caso, ambientes com baixa vazão ou fluxo de água, tais como lagos, lagoas e reservatórios, podem ser mais comprometidos. 

A contaminação da água subterrânea pelas cinzas também foi estudada, e pode ser um ponto de atenção com relação aos distúrbios digestivos em indivíduos que consomem água de poço, ou até mesmo um problema para irrigantes que utilizam essa água, visto que elementos como o cálcio e o cálcio O magnésio pode prejudicar o funcionamento dos equipamentos de segurança.

Dados relacionados ao comportamento humano mostram que o uso errôneo do fogo pode e deve ser minimizado, sobretudo com maior envolvimento de órgãos públicos, por meio da promoção de atividades instrucionais e de educação ambiental para as comunidades, além do combate a práticas que podem ser prejudiciais ao ambiente e à saúde humana. 

O fato é que o equilíbrio na interação entre água, fogo e ações humanas precisa ser urgentemente reestabelecido, de modo a reduzir os danos indiretos, garantindo assim a sobrevivência humana e a sustentabilidade ambiental do planeta.

Núcleo de Comunicação Organizacional - NCO
Embrapa Cerrados

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