A esperança brasileira frente aos próximos parâmetros econômicos e sociais

 *Patricia Punder, advogada e CEO da Punder Advogados

foto/arquivo pessoal


Desde criança, eu ouvia minha avó dizer que o Brasil é o país do futuro, e ela ouvia a mesma frase do meu bisavô. O tempo passou e, infelizmente, acredito que não será na minha geração, nem na próxima, que esta predição deve acontecer, a esperança sempre é a última que morre, pois somos um povo cuja esperança vem da alma.

 Agora, vamos aos fatos, a situação econômica e política brasileira não caminhava bem desde o segundo mandato presidencial da Dilma Russeff. Os freios e contrapesos, ou o equilíbrio, que deveria existir entre os 3 poderes, Executivo, Judiciário e Legislativo, conforme preconiza a Constituição Federal, não funcionou e ainda não estão funcionando de forma harmoniosa. 

Para piorar a situação, tivemos uma pandemia global, que não poderia ser prevista por qualquer empresa ou país, que escancarou a dependência do mundo em relação à China. Para obter mais lucros e não pagar os salários em conformidade com os sindicatos nos Estados Unidos, as empresas migraram para a China, onde as leis trabalhistas eram quase irrisórias. Significa dizer que foi a busca pelo lucro a qualquer preço que ajudou o país do leste asiático a chegar ao ponto de desenvolvimento industrial alcançado, causando estremecimento nas relações com o próprio Estados Unidos.

A mencionada dependência ocasionou, durante a pandemia da COVID-19, uma busca desenfreada por equipamentos de segurança (EPIs) e respiradores. De forma predatória, muitos países simplesmente negociaram com empresas chinesas, que romperam contratos firmados com outros países, para atenderem estes “novos compradores”, inclusive, com os custos decorrentes das multas contratuais. Isso afetou diretamente o Brasil, pois o custo dos equipamentos de segurança alcançou preços astronômicos e a falta de respiradores pode ter sido a causa da perda de muitas vidas. Ademais, como não poderia faltar, os esquemas de fraude e corrupção no Brasil aumentaram estrondosamente. A CPI da Pandemia escancarou um cenário que o cidadão brasileiro tinha pouco conhecimento sobre, e que segundo notícia da CNN Brasil, a conclusão apresentada no relatório final da CPI da Pandemia, afirmou que o governo federal agiu de forma não técnica no enfretamento da pandemia “expondo deliberadamente a população a risco concreto de infecção em massa”.  

Segundo o site Coronavírus Brasil, o número de óbitos chega a quase 700.000 seres humanos de todas as idades, etnias e classes sociais, com a maior incidência sendo no Sudeste, onde se encontram a maior quantidade de trabalhadores do país. Empresas resolveram iniciar demissões em massa, para garantir um “lucro artificial” e pagar os dividendos acordados com seus acionistas. 

Em 2020, o Brasil foi impulsionado a enfrentar a queda do PIB (Produto Interno Bruto) nos três primeiros meses e fechou o ano com um desempenho econômico preocupante, como aponta o portal G1, a queda foi de 4,8% e a maior já registrada em 25 anos. Graças ao colapso sanitário, a desigualdade social ficou evidente no país e fez com que discussões quanto às políticas sociais fossem colocadas em xeque. A aprovação do auxílio de R$ 600,00 (seiscentos reais) pelo Congresso Federal foi um alívio para muitas famílias, apesar de que, em muitos estados brasileiros, o garantido não foi suficiente para bancar uma cesta básica, a consequência foi a fome, o endividamento das famílias e o aumento do número de pessoas e famílias morando nas ruas, situações que fazem parte da nossa realidade até hoje.

Ao mesmo tempo, cabe ressaltar um ponto interessante, pois de acordo com uma pesquisa da PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a concentração de renda no Brasil caiu ao menor patamar em 2020, em comparação com os últimos seis anos, com 1% da população mais rica da sociedade acumulando, em média, 34,9 vezes a renda da metade considerada mais pobre. O resultado disso foi a média do valor mensal de R$453 sendo recebido pela população vulnerável e R$15.816, pela parcela abastada.

Neste interim, o Brasil ainda enfrentou uma postura conflituosa advinda do poder executivo, que negou a pandemia, estimulou o uso de medicamentos sem comprovação cientifica e somente adquiriu vacinas após o governo estadual paulista atuar firmemente na defesa da vacinação. A tática do conflito com outros poderes, ou de encontrar “inimigos”, é comumente praticada pelos partidos de extrema direta de todo o mundo, ou seja, não acontece somente no Brasil. 

Apesar de não concordar com todas as decisões do poder judiciário, não posso negar que este papel foi preponderante durante e após a pandemia e, principalmente, durante as eleições de 2022.  Considero de extrema relevância o papel da CPI da Pandemia, que proveu mais transparência sobre os reais fatos e decisões tomadas durante os dois anos de pandemia. Consequências ainda devem acontecer e espero que os responsáveis passem pelo devido processo legal e, caso comprovado, sejam penalizados. Temos um passivo de vidas perdidas que não pode ser mensurado, seja financeiramente ou emocionalmente.

Para complicar, ainda há o conflito provocado pela Rússia, na antiga república soviética, que alarmou, prejudicou e elevou a economia global a níveis inflacionários, com o encarecimento de alimentos e do petróleo, bem como as perdas inestimáveis de vidas no Leste Europeu, pois, infelizmente, não foram – e ainda não são – apenas os países europeus as únicas vítimas dessa disputa, com a aposta intermitente da Rússia na interdependência econômica e apoio indiscriminado ao poder, responsável direto pela oferta de petróleo e gás para o continente; países africanos também estão sofrendo, pois dependem dos produtos comprados de russos e ucranianos.

Da mesma forma, a guerra na Ucrânia não permitiu que a economia brasileira escapasse, e incluiu o petróleo na lista das grandes quedas, bem como os fertilizantes, insumos com grande dependência da Rússia. Combustíveis fósseis e de grãos surtiram efeitos nocivos sobre a economia, inflacionando o valor dos transportes e expondo o brasileiro aos impactos do conflito. Temos a triste realidade do Brasil não ser mais a 7ª economia do Mundo. Segundo levantamento da agência de classificação de risco Austin Rating, o Brasil caiu de 12º para 13º no ranking das maiores economias do mundo. As taxas de juros do Brasil são as maiores do mundo e nossa inflação ainda não está sob controle, fazendo com que os aspectos sociais dos cidadãos brasileiros sejam ainda mais afetados. 

Uma falácia que existe, e é muito disseminada, é que o brasileiro não gosta de trabalhar e prefere viver de suporte econômico do governo. Ou seja, um povo preguiçoso e manobrável politicamente devido às benesses do governo federal. A verdade é que a população necessita de bases sociais de qualidade, que são educação, saúde e moradia, além de empregos com salários melhores. O cidadão brasileiro paga impostos astronômicos e não usufrui dos frutos. Infelizmente, estamos há anos luz de um cenário social de qualidade, mesmo com a mudança decorrente das eleições para presidência da república.

O novo presidente pegou a tempestade perfeita tanto no cenário nacional, como internacional. Mesmo com todas as boas intenções de recuperar o território nacional, não será em 4 anos que o Brasil conseguirá alcançar o título de país do futuro. Talvez seja o momento de colocar a pedra inicial nesta longa estrada a ser construída, entretanto, temos a cultura brasileira do imediatismo, também conhecida como cultura da bala de prata, onde a economia, o social, a saúde, dentre outros pontos, não irão chegar aos níveis esperados pelos brasileiros no próximo ano, o que pode gerar mais desapontamento e falta de esperança, gerando terreno fértil para radicais que usam as redes sociais e impulsionam “fake news”, criando narrativas como se fossem verdades. Estamos na era da hiperexposição, onde posts, muitas vezes gerados por robôs, são mais importantes que as mídias tradicionais e do que a própria verdade dos fatos.

CAUTELA COMO O ADJETIVO DA VEZ

Cautela. Segundo o dicionário Oxford Languages, é a precaução para evitar dano, transtorno ou perigo; cuidado, prudência. Nos próximos anos, o Brasil provavelmente vivenciará uma união entre o desenvolvimento econômico sustentável e a preocupação social, frente aos investimentos voltados à comunicação com países que já estiverem prontos para as próximas retomadas. A identificação de desafios e estratégias traçadas para o avanço de seus compromissos, diante de ações de sustentabilidade e do pensamento voltado aos povos que ainda estiverem sofrendo com a economia emergente, também será uma vertente e precisará ser colocada em prática com respeito aos freios e contrapesos entre os 3 poderes, ou seja, com cautela. Se o modelo da barganha entre o executivo e o legislativo continuar existindo, não teremos uma democracia plena, no sentido lato da palavra. Portanto, como a canção do cantor e compositor Jorge Ben Jor diz: “cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”. 

Patricia Punder, é advogada e compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. 

Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil). www.punder.adv.br

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