Marcas e cicatrizes da eleição 2010

*Izique Zar de Rezende e *Marçal Rogério Rizzo

Chegamos ao final de mais um processo eleitoral, o de 2010, dito como o mais moderno, rápido e transparente do mundo. Esta festa “democrática” nos ensinou algumas lições, bem como muitas reflexões, que poderão marcar esta ocasião como algo positivo, pois jamais tivemos uma mulher a ocupar o cargo da presidência do Brasil.

Numa retrospectiva histórica isso significa uma expressiva evolução, pois há alguns anos a mulher não tinha uma participação tão ativa no campo social como está tendo agora. Ao “refrescarmos” nossas memórias, lembramos como o Brasil já foi um país machista (e por vezes ainda o é), especialmente no que se refere à década de 1930; período este que as mulheres ainda estavam proibidas de votar. Seu espaço estava restrito ao ato de cuidar dos filhos, das roupas e preparando a alimentação da família, ou seja, da casa em geral. Vale lembrar que a mulher a qual residisse no campo além do dever de cuidar da casa, tinha que ir trabalhar na roça.
Assim, com olhar otimista, embora na perspectiva psicológica, termos uma presidenta na república significa um imenso progresso ao nosso amado país; em especial para as futuras gerações, já que abre um novo “horizonte” às mulheres que sonham ser futuras presidentas, senadoras, governadoras, prefeitas, dentre outros cargos. Chega daquele conceito retrógrado: “mulher deve esquentar a barriga no fogão e esfriar na pia”.
Outra marca curiosa nesse pleito eleitoral foi a aprovação da lei Ficha Limpa (lei complementar 135/2010), que expressou a vontade de milhares de eleitores, estes desejosos por barrar as candidaturas de políticos que têm débitos com a justiça. Chega daquela crença que crime compensa! Infelizmente é mais fácil ser político e tomar decisões que dizem respeito à vida de muitas pessoas, do que estar apto a passar num concurso público.
Não raro, além das marcas, temos cicatrizes, que são os pontos negativos dessa eleição; estes assuntos devem também ser lembrados. O primeiro ponto consiste em observar que os candidatos os quais buscam algum pleito, persistem com as práticas tidas como “sujismundas”. Vocês notaram que, uma vez mais, a distribuição dos chamados “santinhos” emporcalhou nossas ruas? A pergunta nos parece adequada, já que toneladas de papéis foram “jogados” próximos aos locais de votação, na véspera da eleição, por todo o Brasil. Já o segundo ponto tem uma ligação familiar entre a chamada “inclusão digital” e o problemático nível educacional. A urna, por exemplo, para muitos eleitores, é um bicho de sete cabeças, pois o povo brasileiro ainda demonstra dificuldades ao manuseá-la, bem como de gravar os números dos candidatos.
Como se não bastasse, temos também a “sujeira virtual”, que enche nossas caixas eletrônicas de mensagens todos os dias. Aos eleitores foi dada uma tempestade de informações conflitantes, exageradas, tendenciosas e, por raras vezes, úteis e verdadeiras a respeito de diversos candidatos. Portanto, cada vez mais fica nítido que ainda não temos maturidade suficiente para utilizar a rede mundial de computadores (internet) no sentido de promover um debate sério e amplo no que diz respeito aos temas considerados relevantes tanto para o país quanto para pleito eleitoral. Importa lembrar que para os EUA, na eleição do presidente Obama, o uso da internet foi intenso, porém sem o “baixo nível” que ocorreu aqui no Brasil.
Por fim, apontamos de forma dolorosa a última cicatriz: a interferência dos pastores, padres e bispos no processo eleitoral. As igrejas de forma geral já “puxam” dinheiro “a rodo”; e agora, o que querem mais? Os líderes religiosos deveriam orar e não ludibriar os fiéis, intervindo no voto de terceiros, que por vezes sucede de um povo humilde, mal informado e carente, como a maioria da população brasileira.
Desta forma, entre perdas e ganhos acabamos saindo com um “saldo” até que positivo da eleição (se é que realmente existiu). No entanto, resta-nos esperar as cenas dos próximos capítulos; e que no final da história essa passagem por 2010 seja marcada por mudanças positivas e não apenas a cicatriz de um trauma.
*Izique Zar de Rezende é acadêmico do Curso do Direito da UFMS – Campus de Três Lagoas e-mail: iziquezar@hotmail.com – *Marçal Rogério Rizzo é economista e professor da UFMS. Mestre em Economia e Doutor em Geografia. e-mail: marcalprofessor@yahoo.com.br


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