A agricultura de base biológica no Brasil traz nova revolução verde para o campo

 *por Giovana Araújo

 

O agronegócio consolida-se como um dos setores mais estratégicos para o Brasil e o mundo, particularmente diante dos desafios crescentes de segurança alimentar nas próximas décadas. O setor respondeu por aproximadamente 27% do Produto Interno Bruto (PIB) no País em 2020, com uma geração de renda de cerca de R$ 2 trilhões (Cepea/CNA), acumulando crescimento médio de 9% nos últimos 10 anos, a preços correntes. Essa performance de crescimento tem sido pautada pelo uso de tecnologias de natureza biológica, física e digitais nas operações agrícolas e agroindustriais. A expansão da agricultura de base biológica, em particular, será determinante para a jornada virtuosa de crescimento do agronegócio com sistemas agroalimentares mais eficientes, sustentáveis, resilientes e inclusivos.

 

A agricultura de base biológica está presente já algum tempo no Brasil e tem aumentado progressivamente nos últimos anos. O controle de algumas pragas e doenças com uso de agentes biológicos é uma realidade consolidada nas culturas de grãos e da cana-de-açúcar. A Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) é adotada em quase toda área plantada com a soja no Brasil, gerando uma economia no uso de adubos nitrogenados da ordem de alguns bilhões de dólares por ano e contribuindo para mitigação da emissão de óxido nitroso -- um dos gases internacionalmente reconhecidos como gases de efeito estufa, regulados pelo Protocolo de Kyoto. Estes são bons exemplos que refutam a ideia de que existe receio quanto ao uso de bioinsumos por parte de agricultores e pecuaristas no Brasil.

 

A nova geração de produtos de base biológica sinaliza para uma revolução na agropecuária brasileira, por meio de soluções disruptivas com o objetivo de aumentar a produtividade e a qualidade da produção agropecuária de forma econômica e ambientalmente sustentável, atuando no crescimento e nutrição das plantas e animais de produção, e aumentando a resiliência diante das intempéries climáticas. Entre as categorias emergentes de produtos à base biológica no País, estão biofertilizantes, bioestimulantes e condicionadores biológicos de solo.

 

O ritmo de lançamento de novos produtos de base biológica no Brasil nos dá um termômetro do potencial desse mercado. Nos últimos 20 anos, foram registrados 433 produtos biológicos no País, montante superior ao de registros de defensivos químicos no mesmo período. Desse total, 62,1% foram microrganismos, 15,5% macro-organismos, 12,2% bioquímicos e 10,2% de semioquímicos, de acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O crescimento no número de registros foi exponencial nos últimos 5 anos, com recorde anual em 2020 com um total de 96 novos produtos biológicos registrados no Brasil. O mercado de produtos de base biológica é dominado, em grande parte, por empresas de pequeno e médio porte, apesar de já integrar a estratégia de produtos das grandes empresas de insumos com operações no País.

 

As políticas públicas de incentivo têm tido um papel importante no fomento do mercado de bioinsumos no País, com destaque para o lançamento do Programa Nacional de Bioinsumos (PNB) em 2020, que tem como objetivo ampliar e fortalecer a utilização de bioinsumos para promoção do desenvolvimento sustentável da agropecuária brasileira. Entre as ações estratégicas do PNB estão a proposição de um marco regulatório que incentive a produção e uso de bioinsumos e a articulação de instrumentos de crédito e fomento voltados ao desenvolvimento, produção e uso dos bioinsumos. Os incentivos econômicos, por meio de programas de descarbonização, como o RenovaBio, também têm o potencial de serem importantes aceleradores do mercado de bioinsumos no País.

 

Os desafios de crescimento eficiente e sustentável do agronegócio no Brasil tornam a expansão da agricultura de base biológica uma agenda prioritária, particularmente no contexto dos compromissos públicos assumidos pelo País de redução de 50% das emissões dos gases associados ao efeito estufa até 2030 e a neutralização das emissões de carbono até 2050. Adicionalmente, é importante ter em vista que o principal parceiro comercial do agronegócio do Brasil, a China -- que respondeu por 38% das receitas de exportação do setor entre janeiro e agosto deste ano, o equivalente a US$ 31,7 bilhões -- ambiciona um novo paradigma de desenvolvimento, que tem na transformação verde um dos pilares. A expansão da agricultura de base biológica também é uma agenda estratégica para o País, que apesar de ser o maior exportador líquido de alimentos do mundo, e deter cerca de 20% da biodiversidade global, mantém uma dependência elevada de insumos químicos importados para uso na agropecuária.

 

*Giovana Araújo é sócia-líder de Agronegócio da KPMG no Brasil.

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