Quando o ódio se esconde na ilusão do conhecimento

Bruna Richter é graduada em Psicologia pelo IBMR e em Ciências Biológicas pela UFRJ, pós graduanda no curso de Psicologia Positiva e em Psicologia Clínica, ambas pela PUC.
 

Somos passionais. Sem pestanejar percebemos nosso coração pulsar em umdebate entre Palmeiras e Corinthians, entre Salgueiro e Mangueira, bolacha e biscoito. Esses são assuntos sobre os quais podemos arbitrar livremente. Escolhemos aquilo que mais reverbera em nós e o defendemos, torcemos, vibramos. Faz parte de nosso cotidiano a disputa sadia entre diferentes pontos de vista.

Na contramão desse pensamento, ao falarmos sobre assuntos menos triviais, nosso posicionamento deveria ser outro. Contudo, experimentamos uma época onde qualquer pessoa se sente capacitada, ou mais do que isso, impulsionada a opinar sobre os mais diversos temas - inclusive sobre os quais não possui nenhum domínio ou estudo. A possibilidade de fala se transfigurou em necessidade de emissão de opinião.

De certo, com as facilidades que as novas tecnologias trazem consigo, temos muito mais acesso a informações do que em qualquer época pregressa. Basta um clique eencontramos notícias referentes às questões mais distintas de qualquer parte do mundo. E, se de algum modo isso expande nosso campo de aprendizagem, por outro nos leva a falsa ilusão de que somos peritos em áreas que fogem completamente a nossa compreensão.

Esse tipo de posicionamento pode ajudar a sedimentar uma segregação irreversível. Quando polemizamos todo novo acontecimento e discutimos rasamente as ideias que o circundam, de acordo apenas com nossa própria interpretação, destituímos o poder da formação e da educação para a consolidação dainformação. Paramos de observar o que desconhecemos e nos colocamos em uma posição de onisciência prepotente.

Freqüentemente, é nesse lugar que se instalam os maiores duelos. Quanto menos argumentos possuímos, mais cegamente nos atemos ao pouco que sabemos, sem abrir espaço para abraçar os argumentos contrários. E assim, cada vez mais nos aproximamos do ódio e nos fechamos para o desigual, desacreditando o que não coincide com os nossos modos próprios de enxergar o que desejamos.

O narcisismo é um sintoma crescente de nossos tempos. Entender-se como modelo é inevitavelmente criar um conceito prévio do que é certo ou errado, possível ou inaceitável. E quando expandimos esse modo de agir para os setores que nos são desconhecidos, reduzimos a orientação de mestres e doutores ao nível do que supomos fazer sentido. Desacreditamos a ciência. Desabonamos saberes.

Quando confiamos em possuir uma sabedoria específica sobre todas as áreas que atravessam nossa história, nos fechamos para a possibilidade de aprender. Permanecemos hermeticamente encerrados em nossas crenças em detrimento de qualquer relação com aquilo que difere de nós. Desse modo, paulatinamente, dispensamos o conhecimento porque estamos irreversivelmente presos à ilusão dele.

Sobre a autora

Bruna Richter é graduada em Psicologia pelo IBMR e em Ciências Biológicas pela UFRJ, pós graduanda no curso de Psicologia Positiva e em Psicologia Clínica, ambas pela PUC.     Escreveu os livros infantis: “A noite de Nina – Sobre a Solidão”, “A Música de Dentro – Sobre a Tristeza” e ” A Dúvida de Luca – Sobre o Medo”. A trilogia  versa sobre sentimentos difíceis de serem expressos pelas crianças – no intuito de facilitar o diálogo entre pais e filhos sobre afetos que não conseguem ser nomeados. Inventou também um folheto educativo para crianças relacionado à pandemia, chamado “De Carona no Corona”.  Bruna é ainda uma das fundadoras do Grupo Grão, projeto que surgiu com a mobilização voluntária em torno de pessoas socialmente vulneráveis, através de eventos lúdicos, buscando a livre expressão de sentimentos por meio da arte. Também formada em Artes Cênicas, pelo SATED, o que a ajuda a desenvolver esse trabalho de forma mais eficiente.

 

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