GAUDÊNCIO TORQUATO
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A fatura que a República tira de seus ismos - grupismo, mandonismo, caciquismo, nepotismo, individualismo, fisiologismo
– cresce exponencialmente com o acirramento da crise política,
propiciando especulações e versões sobre o campeonato eleitoral de 2018.
A essa altura, já há quem veja Jair Bolsonaro e Luiz Inácio na chegada
ao pódio, quando ainda não se sabe se serão candidatos.
Bolsonaro
só será candidato em cenário de caos político, com expansão da
insegurança coletiva e clamor social sob slogans do tipo: “bandido na
cadeia”, “bandido bom é bandido morto”. Abandonaria alternativas mais
viáveis de uma candidatura majoritária no Rio de Janeiro (governo ou
senado) e mesmo a continuidade como representante na Câmara Federal por
uma opção cheia de riscos? Pela hipótese mais benevolente: tem chances
mínimas de alcançar vitória. A não ser que se admita uma reviravolta nos
padrões culturais e na formação do pensamento das classes sociais.
Os
contingentes de visão conservadora – tendentes a perfilar ao lado de
perfis populistas e identificados com o “poder da bala” – estão na base
da pirâmide social e, admitamos, em segmentos do próprio topo,
particularmente dos extratos que ainda sonham com a volta dos militares
ao poder.
O
espaço habitado por imensos contingentes das classes médias (A, B e C),
cuja forte expressão gera impactos para cima e para baixo, é o mais
largo da pirâmide social. Sua influência equivale a da pedra jogada no
meio da lagoa. Forma ondas que chegam até as margens. O leque de
profissionais liberais – médicos, advogados, empresários de médio e
pequeno porte, comerciantes, profissionais da comunicação etc – se
destaca por ser a maior tuba de ressonância do país.
Essa
orquestra entoa o hino progressista. Pode, até, abrigar aqui e ali um
ou outro nicho mais conservador, mas suas maiores fatias defendem os
avanços civilizatórios e os valores democráticos. Não há hipótese de que
esse poderoso grupamento seja atraído pela metralhadora que é Jair
Bolsonaro.
Da
mesma forma, o rolo compressor das classes médias vencerá o bastião de
Luiz Inácio, onde os exércitos militantes serão em menor número do que
portaram estandartes vermelhos em 2002 e 2006. O lulismo está em
decadência.
Não
se pode dizer, porém, que o ex-metalúrgico está nocauteado. Continuará a
receber a votação da militância e de camadas das margens sociais,
principalmente na região Nordeste. Lula é exímio na arte de mistificar.
Nos fundões, é visto como o “Pai dos Pobres”. Comporta-se como Salvador
da Pátria sem reconhecer o buraco aberto na economia pela era lulista. A
condição de vítima aumentará seu quinhão de votos, mas não a ponto de
fazê-lo subir ao pódio.
É
muito pouco viável o encontro dos extremos, Bolsonaro e Lula, na
encruzilhada eleitoral de outubro de 2018. A crise certamente acirrará
os ânimos. A lógica aponta que perfis menos polêmicos, mais afeitos ao
diálogo e, sobretudo, não flagrados em escândalos, devem ganhar a
preferência do eleitorado. O fato é que não existe, pelo menos ao
alcance da vista, um perfil com tal identidade.
As
estruturas partidárias tendem a escolher candidatos entre seus
integrantes. Mas não há lideranças capazes de construir consensos. O que
se vê é a formação de alas no PMDB, PSDB, PT e em siglas menores. Algum
consenso pode se dar na esfera de siglas como Rede Sustentabilidade e
PDT. Mas os nomes que apresentam, Marina Silva e Ciro Gomes, têm
centímetros abaixo da estatura que se exige para uma candidatura com
reais chances.
Em
suma, as águas que correrão em 2018 estão longe de desembocar no
oceano. Gregos e troianos vão ter de esperar muito para saber que rumo
tomará a pororoca.
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Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato |
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