Lei da carta com AR impõe taxa "limpa nome" e gera perdas de R$ 3,3 bilhões em crédito às famílias

 
Com a lei, recai ao consumidor um ônus dispensável. Um retrocesso ao direito de escolha,
uma vez que o devedor terá que pagar as dívidas por meio mais oneroso
São Paulo, 1º de junho de 2017 A lei paulista 15.659/15, que impõe a substituição da carta simples pelo modelo com aviso de recebimento (AR) e a exigência da assinatura do devedor no aviso antes da inclusão do nome na lista de inadimplentes, completou em março um ano e meio, trazendo prejuízos financeiros ao grupo que deveria ter sido beneficiado com a legislação: o consumidor. É o que conclui levantamento da Associação Nacional dos Birôs de Crédito (ANBC), uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, cujo objetivo é contribuir para o desenvolvimento sustentável do crédito no Brasil.
A exigência de uma correspondência, sete vezes mais cara do que a usada por mais de 30 anos, estimula o uso do protesto em cartório ao isentar da obrigação de envio da carta AR as dívidas previamente protestadas em cartório ou contestadas judicialmente. O incentivo ao protesto gera burocracia e custo ao processo de "limpar" o nome. Antes da lei, "limpar" o nome nos cadastros de inadimplentes era automático com a quitação da dívida, sem taxas nem burocracia.
Muitas empresas, que não tem condições de pagar pela carta com AR, protestaram as dívidas atrasadas de consumidores em cartório. De acordo com estudo da ANBC, março registrou recorde histórico com a negativação de 517 mil CPFs em cartórios de SP, o equivalente a mais de 22 mil pessoas por dia. Um aumento de 79% em relação a março de 2016 e mais de 200% em relação a março de 2015. Desde a entrada em vigor da lei até abril, 6,4 milhões de CPFs foram protestados em cartórios de SP. O cidadão que foi protestado além de pagar a dívida terá que pagar taxa para cancelamento do protesto.
Segundo a ANBC, considerando-se que foram protestadas 8,1 milhões de dívidas, desde a entrada em vigor da lei, a R$ 1.500 de dívida média e pagamento a uma taxa média de 10%, isto dá um custo total de R$ 1,2 bilhão, caso todas as pessoas protestadas queiram limpar o nome no cartório, regularizando todas as dívidas.
A lei ainda impacta empréstimos às famílias pois altera todo o processo de negativação e de recuperação do crédito. O mercado, ao desconhecer a real inadimplência, eleva o risco na concessão de crédito e, consequentemente, os juros cobrados de todos os consumidores. Isso porque, se o credor não consegue prever a probabilidade de receber o dinheiro emprestado, não arriscará conceder crédito. Em tempos de revisão e melhorias na lei do cadastro positivo, que demonstra o real histórico de pagamentos dos consumidores, trazendo mais justiça e sustentabilidade na análise da concessão do crédito, a lei paulista do AR é um verdadeiro retrocesso.
Desde quando foi implantado o AR em SP, o crescimento do crédito às pessoas físicas em SP tem ficado sistematicamente abaixo da evolução observada no agregado dos outros Estados. De set/15 até abr/17, o crédito PF em SP cresceu 6,4% e, fora de SP, 7,2%. Este crescimento menor em SP comparativamente a fora de SP representa uma perda de R$ 3,3 bilhões.
Quando a lei entrou em vigor, em 9 de janeiro de 2015, iniciou-se uma batalha jurídica. A Federação das Associações Comerciais de São Paulo (Facesp) entrou na Justiça Estadual com uma ação direta de inconstitucionalidade e obteve liminar favorável. Em agosto de 2015, no entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo revogou a liminar e suspendeu a ação até o julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), de três outras ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a mesma lei.
A nova lei paulista, que impõe a carta com AR, está sendo contestada hoje por bancos, empresas, o governo do Estado de SP e pelo Banco Central, regulador do mercado de crédito, e pelo Ministério Público de SP.
Tanto o Ministério Público quanto o Banco Central consideram a lei paulista inconstitucional. A Procuradoria Geral de Justiça de SP (Ministério Público) entende como inconstitucional a lei n. 15.659/2015, principalmente, pelo fato de a matéria ser de direito civil e comercial (competência legislativa exclusiva da União) e, mesmo no âmbito do direito do consumidor, a lei paulista extrapola os limites da competência legislativa estadual, pois modificou a lei federal (a lei estadual criou a necessidade de um ato bilateral – a comunicação e a assinatura/consentimento –, enquanto que a lei federal exige um ato unilateral – a comunicação.)
A justificativa do projeto de lei que originou a nova regra em São Paulo seria a de suprir falhas supostamente existentes no processo de comunicação das dívidas atrasadas. Mas, a eficácia da comunicação dos birôs de crédito é comprovada pelo Ranking do Procon-SP de 2014 por demonstrar que houve duas reclamações por suposta falta de comunicação dos birôs de crédito no ano inteiro. Já em 2015, houve apenas uma reivindicação. Também, nos canais de atendimento das empresas de proteção de crédito e em outros canais de proteção do consumidor, como demais PROCONs, ReclameAqui e Consumidor.gov.br, o índice de reclamações sobre a falta de comunicação é praticamente inexistente.
Sobre a ANBC
A Associação Nacional dos Birôs de Crédito (ANBC) é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos que tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável do crédito no Brasil. A entidade congrega os birôs de proteção ao crédito que atuam no território brasileiro e mantém relacionamento com associações internacionais para promover as melhores práticas do setor. Para mais informações, acesse: www.anbc.org.br
 

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