Máfia do Asfalto: após ação do MPF em Jales (SP), Justiça bloqueia bens de 20 réus por fraudes em Auriflama

Ex-prefeito, empresários do grupo Scamatti e servidores estão entre os envolvidos; direcionamento de sete licitações causou prejuízos de R$ 1,29 milhão

A Justiça Federal determinou o bloqueio de bens de 12 pessoas e oito empresas envolvidas em licitações fraudulentas em Auriflama (SP) entre 2007 e 2012. Os réus integravam a chamada Máfia do Asfalto, que agia em dezenas de municípios do noroeste paulista e foi alvo da Operação Fratelli, deflagrada em abril de 2013. Entre os participantes do esquema estão o ex-prefeito da cidade José Jacinto Alves Filho, conhecido como Zé Prego, e empresários do grupo Scamatti, que coordenavam as fraudes. A decisão liminar é resultado de uma ação civil pública que o Ministério Público Federal em Jales ajuizou em agosto do ano passado.

A indisponibilidade de bens alcança o valor de R$ 1,29 milhão para cada uma das 12 pessoas que respondem ao processo. A quantia equivale ao prejuízo que as irregularidades causaram aos cofres públicos, em cifras atualizadas. O bloqueio do montante visa à garantia de recursos para o cumprimento de eventual sentença que condene um ou mais réus ao ressarcimento dos danos. Já o congelamento de ativos das empresas envolvidas chega ao total de R$ 1,69 milhão.

Os réus fraudaram sete procedimentos licitatórios em Auriflama durante as duas gestões de Zé Prego, todos financiados com recursos dos Ministérios das Cidades e do Turismo. O então prefeito foi cooptado por Olívio Scamatti para implantar no município o mesmo esquema que já vinha adotando em outras cidades: direcionar concorrências públicas para favorecer as empresas da família Scamatti, a qual mantinha contato com congressistas em Brasília e obtinha a liberação de verbas da União por meio de emendas parlamentares.

CONVITE. A Prefeitura de Auriflama parcelou irregularmente o objeto dos contratos, referente à construção de guias e sarjetas e ao recapeamento de ruas e avenidas do município. Algumas vias foram listadas em mais de um procedimento licitatório, embora o serviço a ser prestado fosse o mesmo. A manobra permitiu o enquadramento dos certames na modalidade convite, que exigia apenas a convocação de ao menos três empresas escolhidas pela própria administração pública. Caso os serviços fossem englobados em um número menor de licitações, a modalidade a ser adotada possibilitaria a participação de companhias que não faziam parte do esquema.

De acordo com o procurador da República responsável pela ação, nenhum estudo técnico foi produzido para demonstrar que a fragmentação de serviço traria vantagens econômicas em relação ao eventual ganho de escala. "Não há dúvidas de que os agentes públicos municipais parcelaram as obras de recapeamento asfáltico, com consequente fracionamento das despesas, a fim de permitir a utilização da modalidade 'convite', quando o adequado seria a modalidade 'tomada de preços'. Com isto, favoreceram as empresas do grupo Scamatti, que foram convidadas para todas as licitações, com pouca ou nenhuma publicidade", descreveu.

PARCEIRAS. Na tentativa de mascarar as fraudes, as diferentes empresas do grupo não participavam de um mesmo procedimento licitatório. Para que o direcionamento fosse concluído, a família Scamatti contava com empresas parceiras, que participavam ficticiamente dos certames. Em troca, recebiam o mesmo favor dos Scamatti em outras licitações na região. Com as ofertas previamente combinadas, as vencedoras sempre conseguiam os contratos com cifras pouco inferiores às das supostas concorrentes.

O esquema beneficiou três empresas do grupo Scamatti. A Scamvia Construções e Empreendimentos e a Demop Participações venceram cinco das sete licitações. As obras previstas nas outras duas, cujos editais tinham a mesma data, ficaram a cargo da Mirapav – Mirassol Pavimentação, que, apesar de possuir capital social irrisório, não ter funcionários e nunca ter desenvolvido atividades econômicas, assinou os contratos com a Prefeitura no valor total de R$ 230 mil. Para preencher o número mínimo de concorrentes, participaram dos processos as parceiras CBR - Construtora Brasileira, Ciro Spadacio Engenharia e Construção, Miotto & Piovesan Engenharia e Construção, Trindade Locações e Serviços e Ultrapav Engenharia e Construções.

SERVIDORES. O ex-prefeito não é o único agente público de Auriflama envolvido nas fraudes. O então assessor de Zé Prego, José Voltair Marques, conhecido como Zé do Brás, presidiu comissões de licitação responsáveis pelas obras e chegou a ser flagrado em conversas telefônicas com integrantes do grupo Scamatti tratando do esquema. Marisa Braz do Nascimento, à época diretora do Departamento de Compras e Processamento de Licitações da Prefeitura, também participou das irregularidades ao assinar os editais e atuar em várias fases do processo de contratação das vencedoras.

Ao lado de Zé Prego, dos servidores municipais e de Olívio Scamatti, fazem parte da lista de pessoas físicas que respondem ao processo os irmãos do empresário (Edson, Pedro, Mauro André e Dorival Scamatti) e sua esposa, Maria Augusta Seller Scamatti. Completam o rol de réus Luiz Carlos Seller e Guilherme Pansani do Livramento, que constituíram a Mirapav, e o engenheiro da Demop Fernando César Matavelli. Parte deles já é alvo de uma ação penal, também proposta pelo MPF, na qual são acusados por formação de quadrilha, falsidade ideológica e fraude em licitações.

Desta decisão cabe recurso pelas partes envolvidas e, ao final do processo de improbidade, o MPF quer que os réus sejam condenados não só ao ressarcimento dos danos, mas também ao pagamento de multas. A Procuradoria pede ainda que a Justiça determine a suspensão dos direitos políticos dos envolvidos e a proibição de firmar contratos com a administração pública ou receber benefícios fiscais e creditícios.

O número da ação de improbidade é 0001082-46.2016.403.6124. Já o número processual da ação penal é 0000372-31.2013.4.03.6124. A tramitação de ambas pode ser consultada em http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/.

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